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Encyclopédie internationale
des histoires de l’anthropologie

As linguagens visuais da «Amazônia urgente»: artes indígenas e saberes ecológicos na vida‑obra de Berta Gleizer Ribeiro

Bianca Luiza Freire de Castro França

PPHPBC/FGV

2024
Pour citer cet article

França, Bianca Luiza Freire de Castro, 2024. “As linguagens visuais da «Amazônia urgente»: artes indígenas e saberes ecológicos na vida‑obra de Berta Gleizer Ribeiro”, in Bérose - Encyclopédie internationale des histoires de l'anthropologie, Paris.

URL Bérose : article3655.html

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Publié dans le cadre de HITAL - Histoire transatlantique des Anthropologies d’Amérique Latine / International Research Network - INSHS (CNRS), dirigé par Christine Laurière ; Équipe du Departamento de Antropologia/Museu Nacional/UFRJ, LACED, sous la direction d’Antonio Carlos de Souza Lima.

Résumé : Berta Gleizer Ribeiro (1924-1997) est une anthropologue roumaine et brésilienne d’origine juive, née à Beltz, en Bessarabie, dans la région de Moldavie. Diplômée en géographie et en histoire, elle est anthropologue, ethnographe et muséologue. Elle a contribué à l’anthropologie brésilienne au XXe siècle par ses études sur la culture matérielle et l’art visuel des indigènes brésiliens, ainsi que par ses études sur l’adaptabilité humaine dans les basses terres tropicales, un sujet important pour le domaine de l’anthropologie écologique. Berta a utilisé ses études sur la culture matérielle et l’art visuel comme fil conducteur pour soulever des questions sur la contribution des indigènes à une exploitation plus durable des ressources naturelles grâce aux connaissances ethniques : gestion de l’eau et de l’agriculture, maîtrise de l’astronomie, de l’ethnobotanique, de l’ethnopharmacologie, de la faune et de la flore, ainsi que d’autres technologies indigènes liées aux « arts de la vie », telles que la céramique, le filage, le tissage, le tressage et le plumage. Son héritage rassemble les connaissances les plus avancées disponibles à l’époque sur la forêt amazonienne et sur la culture matérielle, l’art visuel et la capacité d’adaptation humaine de ses peuples d’origine. Il est possible de promouvoir des dialogues féconds entre les travaux de Berta Gleizer Ribeiro et les études contemporaines en anthropologie de la matérialité, ainsi qu’avec les études anthropologiques contemporaines liées à la vie végétale. Parmi les anthropologues influencés par ses travaux, citons Lúcia Hússak van Velthem (Museu Paraense Emílio Goeldi) et Regina Pollo Müller (Unicamp).

Introdução

Berta Gleizer Ribeiro (1924-1997) foi graduada em Geografia e História, antropóloga e etnógrafa, e foi também museóloga com registro profissional no Conselho de Museologia do Rio de Janeiro. Formou coleções para museus brasileiros, foi idealizadora de exposições, pesquisadora, escritora, produtora de audiovisual, militante da causa indígena e da divulgação científica. [1]

Ao longo dos anos, Berta realizou pesquisas e estudos em diferentes campos do conhecimento : Antropologia, Museologia, Arqueologia, Etnobiologia e História. Sua contribuição para a Antropologia brasileira reúne os conhecimentos mais avançados existentes em sua época sobre a floresta tropical amazônica e seus povos originários. Usou seus estudos de cultura material e arte visual dos indígenas brasileiros como fio condutor para levantar questões acerca da contribuição indígena para uma exploração mais sustentável dos recursos naturais através dos etnosaberes : manejo hídrico e agrícola, domínio da Astronomia, Etnobotânica, Etnofarmacologia, domínio da fauna e da flora, dentre outras tecnologias indígenas atreladas às “Artes da Vida”, como cerâmica, fiação, tecelagem, trançado e plumária. “Artes da vida” é uma expressão destacada por Berta em várias de suas obras (RIBEIRO, Berta G. 1980c ; 1986b e 1992b) ao considerar os estudos de tecnologia indígena, citando Lewis Henry Morgan, que chamava “Arts of life” (MORGAN, 1877) as técnicas que implicam no desenvolvimento de implementos para o manejo de recursos naturais. Morgan considerou cerâmica, trançado, fiação e tecelagem como técnicas básicas das artes da vida, artes essas que Berta irá estudar a fundo ao longo de sua obra, e fará o acréscimo da arte plumária dos indígenas brasileiros como uma quarta “arte da vida indígena”.

Além disso, Berta oferece em sua obra informações práticas, necessárias para os estudos dos objetos encontrados nas aldeias e recolhidos aos museus. Não menos importante, ela demonstrou o muito que os saberes dos povos indígenas têm a nos ensinar sobre sustentabilidade, o convívio com o meio-ambiente e o respeito à natureza.

Berta Ribeiro atuou em muitas frentes, ao longo de sua carreira. Como professora da área de concentração em Antropologia da Arte do Mestrado em História da Arte (hoje Programa de Pós-graduação em Artes Visuais [2]) na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), tinha sua metodologia docente em consonância com a proposta de trabalho das pesquisas de cultura material no final da década de 1980, vinculando os artefatos às sociedades que os produziram e aos acervos depositados nos museus, a partir de questões colocadas pela Etno-história, pela Etno-estética, pela organização social, pela representação visual e pela identificação étnica (GRUPIONI, 2008).

Como atuante na área de museologia, compreendia os museus como ferramentas pedagógicas com objetivos didáticos, científicos e político-polêmicos, ao mesmo tempo que como uma área de lazer e reflexão (RIBEIRO, Berta G., 1989a). Nas exposições que organizou, havia sempre uma perspectiva otimista de um futuro de harmonia em que os povos indígenas teriam um importante papel a cumprir. Como colecionadora de objetos, suas coleções demonstravam as práticas produtivas e sociais dos indígenas, somadas à descrição minuciosa que fazia dos objetos coletados, a fim de estudá-los e registrar a tecnologia indígena empregada na produção dos mesmos.

Como divulgadora científica, preocupou-se em traduzir os estudos antropológicos para publicações, em linguagem acessível para as massas, como seus textos para as revistas Ciência Hoje e Ciência Hoje das Crianças (RIBEIRO, Berta G., 1991d ; RIBEIRO, Berta G. E KÊHÍRI, 1991a, 1987a), bem como seu investimento na produção de livros voltados aos professores secundaristas, como é o caso de O índio na História do Brasil (1983) e O índio na Cultura Brasileira (1987).

Berta selecionou, atualizou e reformulou seus escritos de forma a propiciar conexões e fecundos diálogos com a Antropologia contemporânea, oferecendo, assim, etnografias, reflexões e práticas inspiradoras. Refletir sobre a trajetória de Berta compreende pensar sobre um aspecto pouco reconhecido na História intelectual latino-americana : a participação das mulheres na construção das Ciências Sociais.

Utilizo a expressão “vida-obra” apresentada por Renata Cesar de Oliveira (2020), pois não dissocio a obra de Berta de sua vida pessoal. Ela é um dos casos de pesquisadores e intelectuais dos quais a vida pessoal e a produção acadêmica se misturam.

Uma vida cheia de recomeços

Bertha Gleizer nasceu em 2 de outubro de 1924, em Beltz (Balti), na província da Bessarábia, região da Moldávia (anexada à Romênia, em 1918). De origem judaica, seus pais eram o sindicalista Motel Gleizer e Rosa Sadovnic Gleizer, que tinham duas filhas, Genny e Bertha. Segundo Amorim (1998), a família de Berta passava por uma crise financeira e, devido ao clima nada favorável aos judeus comunistas na Europa Oriental, em 1929 Motel Gleizer decidiu emigrar para o Brasil, na esperança de se estabelecer e depois trazer a esposa e as filhas. Ao chegar no Brasil, se estabeleceu como pequeno comerciante no Rio de Janeiro, morando na comunidade judaica da Praça Onze, onde também foi redator do semanário judeu O Começo. Rosa Sadovnic não resistiu às privações vivenciadas na Europa e cometeu suicídio. As irmãs Bertha e Genny foram trazidas ao Brasil em 1932, com ajuda da Jewish Colonization Association, uma organização internacional criada em 1891 por Maurice de Hirsch (1831-1896). Quando chegaram ao Brasil, Berta (já sem h no nome) tinha oito anos e Genny, quinze anos.

Apesar do clima de recomeço, Berta não contou com o carinho familiar e a segurança da comunidade judaica da Praça Onze por muito tempo. Em 1935, sua irmã Genny foi presa em São Paulo, para onde se mudou a trabalho, e expulsa do Brasil em outubro no mesmo ano pelo governo de Getúlio Vargas. O pai de Berta teria o mesmo destino da filha Genny, no ano seguinte. Genny Gleizer mudou-se para São Paulo a trabalho, assim que se adaptou à Língua Portuguesa. Com 17 anos de idade trabalhava em uma fábrica, quando, em julho de 1935, foi presa sob a acusação de que estaria participando da organização de um congresso da juventude comunista, da qual seria militante. Embarcada no navio Aurigny, Genny foi resgatada por membros do Partido Comunista Francês que trabalhavam no cais, quando o navio chegou à França. A vida de Genny, segundo Callado (2016), possui registros incertos em relação ao seu paradeiro e vivências. Genny adotou o nome Jenny Simoza após passar pela Venezuela e casar-se com um boliviano, com quem teve uma filha de nome Renée, em 1942. Depois de passar pela Venezuela, Genny foi morar em Nova York com residência fixa, onde ficou até sua morte em 1999.

Motel Gleizer foi preso no dia 26 de novembro de 1935, junto com outras sete pessoas, sendo expulso do Brasil em 1936. Sobre Motel, Dines (2008), diz que ao saber da prisão da filha, se dirigiu à redação de A Noite para contradizer as declarações da polícia de que Genny teria sido enviada da Romênia para organizar o congresso comunista juvenil. Logo após a entrevista, aconteceram incursões da polícia política contra os centros operários de judeus no Rio de Janeiro. Na Praça Onze, invadiram o Centro Cultural dos Trabalhadores, onde funcionava a redação do semanário judeu O Começo, do qual Motel Gleizer era redator. Foram presos e deportados vários militantes, principalmente por estarem com papéis irregulares, dentre eles Motel Gleizer. Segundo Amorim (1998), Motel, sem dinheiro e desempregado, passou por muitas dificuldades na França, onde adoeceu e morreu. Vagou por Paris procurando a filha Genny, que nunca encontrou.

Berta ficou órfã aos 11 anos de idade, vivendo no Rio de Janeiro tutelada pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), tutela essa que não é clara, e se manifestava numa espécie de incentivo financeiro e mais tarde, na intromissão em seu namoro com Darcy Ribeiro (1922-1997), com quem foi casada de 1948 a 1974. Meses depois de ficar sozinha no Rio de Janeiro, Berta foi para São Paulo morar com a família Fridman, parentes de seu pai. Segundo Amorim (1998), Berta não podia levar a vida de uma criança normal. Vivia escondida para não ser identificada como a irmã de Genny e filha de Motel Gleizer, evitando assim ser deportada para a Romênia, onde não tinha parentes. Aprendeu a ler e escrever de forma clandestina, só tardiamente ingressando na escola regular. Ela assistia as aulas em um curso de alfabetização para adultos, à noite, no Centro do Rio de Janeiro (FRANÇA, 2023, p. 387). Só mais tarde, já em São Paulo, matriculou-se na Escola do Comércio Álvares Penteado, onde frequentou o curso técnico em Contabilidade e aprendeu a datilografar, atividade que levaria com carinho pela vida inteira, datilografando não só sua obra, mas também grande parte da obra de Darcy Ribeiro.

Em 1940, aos 16 anos, Berta conseguiu um emprego e mudou-se para um quarto de pensão, no qual morou sozinha. Disse a Amorim (1998) que este foi um dos momentos mais felizes de sua vida, pois estava cansada de viver em casas alheias, embora amigas. Finalmente livre, graças ao emprego de datilógrafa, foi através da máquina de escrever que Berta começou a escrever sua própria história.

Fig.1.
Berta Ribeiro em sua máquina de escrever no escritório de sua casa em Copacabana, Rio de Janeiro, s/d.
Fonte : Acervo da Fundação Darcy Ribeiro

“De seu amor por Darcy adveio a paixão pela Antropologia”

A jovem datilógrafa Berta Gleizer, em 1946, conheceu durante um comício do PCB, em São Paulo, o estudante da Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo, Darcy Ribeiro, a quem estaria ligada para o resto de sua vida. Tempos depois, Berta foi enviada para o Rio de Janeiro, segundo Callado (2016), para trabalhar na sede do Comitê Central do Partido Comunista. Quando o Partido Comunista descobriu o namoro, enviou Berta a Nova York, para passar uma temporada com a irmã. Ao voltar dos EUA, Berta vai direto ao encontro de Darcy, que estava em trabalho de campo no Pantanal mato-grossense, junto aos indígenas Kadiwéu. Se casaram no dia 15 de maio de 1948, no Rio de Janeiro, tendo como testemunhas o antropólogo Max Boudin (1914-1991) e o irmão de Darcy, Mário Ribeiro (1924-1999). Darcy havia sido recentemente admitido na Seção de Estudos do Serviço de Proteção aos Índios (SPI). Segundo Callado (2016, p. 27), Berta e Darcy eram “companheiros na política e na Antropologia.” Berta passa a assinar como Berta G. Ribeiro e acompanha o marido nas expedições, organizando e datilografando o material coletado e analisado. “De seu amor por Darcy adveio a paixão pela Antropologia, despertada nas primeiras expedições do marido entre 1949 e 1951” (AMORIM, 1998, p. 35). Entre 1948 e 1949, estiveram entre os indígenas Kadiwéu, Guarani Kaiowá, Terena e Ofaié-Xavantes, do sul do Mato Grosso.

Fig. 2.
Berta Ribeiro entre os Kadiwéu, no Mato Grosso do Sul, 1948.
Fonte : Acervo do Museu do Índio

Durante as primeiras expedições acompanhando o marido, Berta resolveu estudar para compreender melhor os indígenas brasileiros. Em 1950, se matriculou no curso de bacharelado em História e Geografia, na Faculdade de Filosofia da Universidade do Distrito Federal (UDF), hoje Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Formou-se em 1953, ano em que começou a lecionar Geografia do Brasil, no Instituto Lafayette, tradicional instituto de educação do bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, fechado no início dos anos 1980. No mesmo ano, 1953, Berta iniciou seu estágio na Divisão de Antropologia do Museu Nacional, onde começou a se dedicar à classificação dos adornos plumários dos indígenas brasileiros.

O interesse de Berta pela Antropologia esteve conectado, desde o início, à construção de trabalhos que servissem de referência para aplicação da prática antropológica através de classificações e taxonomias. Para Berta (RIBEIRO, Berta G., 1985a), as classificações e taxonomias eram condição preliminar que se impunha aos estudiosos de cultura material. Portanto, era preciso forjar instrumentos operativos para descrição dos objetos, tais como um dicionário de técnicas e formas, ou uma classificação tipológica e respectiva taxonomia. Berta dedicou-se ao trabalho de criar manuais classificatórios dos objetos dos indígenas brasileiros, como é possível ver em suas obras : Arte Plumária dos Índios Kaapor (com Darcy Ribeiro, 1957) ; “Bases para uma classificação dos adornos plumários dos índios do Brasil” (1957) ; “A arte plumária dos índios Urubus-Kaapor” (1980b) [3] ; ‘A Civilização da Palha : A arte do trançado dos índios do Brasil’ (1980c),tese de doutorado defendida em 1980 no curso de Antropologia Social da Universidade de São Paulo (USP), orientada por Amadeu José Duarte Lana [4] ; “A Arte do Trançado dos Índios do Brasil : Um estudo taxonômico” (1985ª) ; “A Arte de Trançar : Dois macroestilos, dois modos de vida” (1986ª) ; “A Linguagem Simbólica da Cultura Material” (1986g) ; “Artes Têxteis Indígenas do Brasil” (com Darcy Ribeiro, 1986b) ; “Glossário dos Tecidos” (1986c) ; “Glossário dos Trançados” (1986d) ; e o famoso Dicionário do Artesanato Indígena (1988c), considerado principal referência para pesquisadores de cultura material dos indígenas brasileiros e museus etnográficos no Brasil.

Em 1957, Berta recebeu o Prêmio João Ribeiro, de ensaios, agraciado pela Associação Brasileira do Livro (ABL), pela publicação Arte plumária dos índios Kaapor (1957), em colaboração com Darcy Ribeiro. No mesmo ano, participou do Simpósio Internacional de Curare e Substâncias Curarizantes (FRANÇA 2019), que ocorreu no Museu Nacional, no qual foi responsável pela exposição de armas e ferramentas usadas para manipulação do curare.

Em 1958, Berta, que estava vinculada ao Museu Nacional na qualidade de Naturalista contratada, teve de interromper suas atividades de pesquisa devido à mudança para Brasília. Darcy Ribeiro foi para Brasília para organizar a Universidade de Brasília (UnB), a convite de Juscelino Kubitschek. Nesse momento, Berta acaba se tornando o braço operacional de Darcy. O casal nunca teve filhos.

Fig. 3.
Berta e Darcy Ribeiro em Brasília, s/d.
Fonte : Acervo da Fundação Darcy Ribeiro

Durante a Ditadura Civil Militar brasileira (1964-1985), Darcy e Berta estiveram exilados no Uruguai (1964-1968), na Venezuela (1969), Chile (1971) e no Peru (1972). Nos primeiros anos de exílio, Berta dedicou-se quase que exclusivamente a auxiliar Darcy nos seus trabalhos, que foram muitos. Era a sua principal interlocutora antropológica. Fazia levantamentos estatísticos, pesquisas bibliográficas, traduções, auxiliou principalmente nas obras da coleção Estudos de Antropologia da Civilização, publicados pela editora Vozes, em 1978 e em A Universidade Necessária (1978). Também auxiliou na elaboração do conceito de transfiguração étnica [5] que é apresentado no livro Os índios e a civilização (1977) de Darcy Ribeiro. “O foco principal do livro era justamente o estudo do processo de transfiguração étnica, pensado a partir de dados compulsados da experiência brasileira.” (PACHECO DE OLIVEIRA, 2020, p. 28).

Quando estavam no Peru, Berta voltou a estudar, na Oficina de Socialização, onde fez uma pesquisa sobre estrutura familiar e socialização, colhendo dados para a dissertação “Crianças trabalhadoras : trabalho e escolaridade de menores em Lima”. Mesmo não concluindo a dissertação, por causa de sua volta ao Brasil, Berta apresentou essa pesquisa na X Reunião da Associação Brasileira de Antropologia (ABA).

Fig. 4.
Berta Ribeiro (em pé de vestido preto) na Reunião Brasileira de Antropologia (RBA), Recife, Pernambuco, 1958.
Fonte : Acervo pessoal do antropólogo Renato Athias

Berta voltou para o Brasil, em 1974, em meio à crise matrimonial com Darcy. Após o divórcio, Berta e Darcy trabalharam juntos na coletânea Suma Etnológica Brasileira, publicada em 1986. A coletânea com três volumes publicados (1986a, 1986b, 1986c) se trata de uma edição traduzida e atualizada, para a época, do Handbook of South American Indians (STEWARD (1948a ; 1948b).

Ao final da vida, ambos acometidos pelo câncer, voltaram a conviver e se (re)apaixonaram. Disse Darcy em Confissões (2016, p. 126), que após 25 anos de casados e 25 anos separados, ambos voltaram a conviver de forma pacata e com muito amor. Segundo Amorim (1998), Berta sentia-se feliz, confortada e grata com o apoio de Darcy, a quem sempre amou apesar da separação, porém, desconfiava das declarações de amor que Darcy tornou públicas em entrevistas e no último livro que publicou antes de morrer, Diários Índios (1996) – bem como no livro póstumo Confissões (2012).

Fig. 5.
Berta e Darcy Ribeiro na década de 1990 após a reconciliação. Ambos no fim de suas vidas, já doentes pelo câncer.
Fonte : Acervo da Fundação Darcy Ribeiro

Segundo Darcy Ribeiro (2012), Berta não era judia ativa e não queria ser enterrada no cemitério israelita. Queria ser cremada e havia assinado os papéis competentes para tal : “Então, eu dizia a ela nas minhas visitas, que tratasse de morrer logo, para poder ser bem cremada. Resistindo ao câncer como resistia, podia morrer depois de mim, o que seria uma lástima, porque ninguém a cremaria direito. (RIBEIRO, Darcy, 2012, p. 126).” Resistiu ao câncer mais que Darcy, que morreu em 17 de fevereiro de 1997, Berta morreria em 17 de novembro do mesmo ano. Foi enterrada como judia no Cemitério Comunal Israelita, no bairro do Caju (Rio de Janeiro, RJ), no dia 19 de novembro de 1997. Genny, de Nova York, teria providenciado o enterro com “o rabino Goldman, da [rua] Venâncio Flores, no Leblon” (CALLADO, 2016, p. 161). Inconformados com o desrespeito ao desejo de Berta de ser cremada, os amigos decidiram não comparecer ao seu enterro. Ela frequentemente dizia que não poderia ser judia, porque não praticava a religião. Se sentia Desana, povo indígena com o qual trabalhou por longo tempo e dizia dever todo o seu trabalho.

Uma vida-obra dedicada às artes da vida indígena

Já divorciada, em 1975, depois de prestar consultoria para o projeto do Centro de Documentação Etnológica e Indigenista do Museu do Índio, dirigido por Carlos de Araújo Moreira Neto, Berta foi trabalhar na editora Paz e Terra como assistente da Direção. Berta trabalhou na coleção Didática, fazendo contatos. Na Paz e Terra, viabilizou a publicação de importantes autores latino-americanos no Brasil, dentre eles o uruguaio Eduardo Galeano (1940-2015). Manteve também intensa colaboração com a Biblioteca Ayacucho, fundada pelo amigo Ángel Rama (1926-1983).

Em 1977, Berta retornou ao Museu Nacional a partir de uma bolsa de pesquisa que obteve do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). A partir dessa bolsa, foi trabalhar no subprojeto Corpus Etnográfico do Alto Xingu, vinculado a atividades inclusas no projeto Etnografia e Emprego Social da Tecnologia Indígena e Popular do Setor de Etnologia e Etnografia do Museu Nacional, coordenado por Maria Heloísa Fénelon Costa (1927-1996) [6], na época curadora do Setor de Etnologia desde 1961.

Heloísa Fénelon e Berta Ribeiro fizeram boas parcerias ao longo de suas carreiras. Segundo Veloso Jr. (2021), Heloísa e Berta trabalharam juntas a primeira vez em 1956, enquanto Heloísa iniciava sua formação antropológica como estagiária do Museu do Índio e Berta era Naturalista contratada do Setor de Etnologia do Museu Nacional. Heloísa fez ilustrações para Arte Plumária dos Índios Kaapor (RIBEIRO, Berta G. e RIBEIRO, Darcy (1957) e também para “Bases para uma classificação dos adornos plumários dos Índios do Brasil” (RIBEIRO 1957). Inclusive, na introdução de “Bases para uma classificação dos adornos plumários”, Berta agradece a “Heloísa Fénelon, do Curso de Aperfeiçoamento em Antropologia Cultural do Museu do Índio, pelos desenhos das pranchas”. Heloísa desenhou onze pranchas para a obra.

Ambas seguiram diferentes trajetórias, mas seus caminhos se encontraram institucionalmente e na mesma temática, pois, tanto Heloísa quanto Berta desenvolveram pesquisas sobre arte e artesanato indígena, sobre classificação museológica de materiais indígenas e mantiveram relações com o Museu do Índio e o Museu Nacional. Berta foi contratada para o Setor por Heloísa em 1977, e Heloísa publicou artigos na Suma Etnológica Brasileira, coordenada por Berta e Darcy Ribeiro. Heloísa publicou em coautoria com Hamilton Botelho Malhano o artigo “A habitação indígena brasileira” (1986), no volume II ; e publicou sozinha o artigo “O sobrenatural, o humano e o vegetal na iconologia Mehináku” (1986) no volume III – Arte Índia.

As duas dividiram coordenação de Grupo de Trabalho na Reunião Brasileira de Antropologia (RBA), de 1986. Além disso, marcaram presença na banca de concurso uma da outra : Berta fez parte da banca para professora titular em Etnologia de Heloísa, e em 1988, Heloísa participou da banca do concurso de Etnologia em que Berta Ribeiro e Antonio Carlos de Souza Lima [7] foram aprovados. Berta e Heloísa também eram professoras da Pós-graduação em História da Arte na Escola de Belas Artes da UFRJ.

Segundo Amorim (1998), sempre trabalhando muito, Berta obteve sucessivas bolsas que contribuíram para seu sóbrio sustento. Logo após a conquista da bolsa, iniciou o doutorado em Antropologia Social na USP, título que alcançou com a tese ‘A civilização da palha : a arte do trançado dos índios do Brasil’ (1980c), orientada por Amadeu José Duarte Lana e apresentada em dois volumes no ano de 1980. É um trabalho complexo e completo sobre a arte do trançado indígena e sua relação com a cultura e vida material dos indígenas xinguanos e dos afluentes do rio Negro, com considerações, sobre o trançado dos indígenas brasileiros em geral.

A partir de 1977 sua vida profissional ganhou uma dimensão mais relevante. Segundo van Velthem (1997), ao longo de sua carreira como antropóloga seus caminhos e interesses foram vastos : Antropologia, Ecologia, Museologia, Arte e Cultura Material indígena. Ao todo, Berta publicou : cinco artigos em catálogos ; dezessete artigos em periódicos nacionais ; cinco artigos em periódicos estrangeiros ; dezenove capítulos publicados em livros diversos ; nove livros publicados e três textos inéditos, dentre eles sua tese de doutorado ; coleções formadas para o Museu Nacional, Museu do Índio e Museu Paraense Emílio Goeldi. Além dos livros e artigos, de autoria individual, produziu um filme documentário sobre os Asuriní e os Araweté e forneceu argumento e material etnográfico para outro filme : “Gain Panãn e a origem da pupunheira”, animação dirigida por Luiz Fernando Perazzo, exibida no Festival Anima Mundi de 1996. Baseada em depoimentos de dois indígenas Desana sobre sua cosmologia, aos quais concedeu os direitos autorais da publicação, ainda escreveu e editou em 1980 a obra Antes o mundo não existia : mitologia dos antigos Desâna-Kêhíripõrã. (KÊHÍRI, TÕRÃMÜ, 1995 [1980]).

Berta participou da produção de outros filmes etnográficos, até mesmo dirigindo, sempre tendo suas pesquisas como base. Nos documentários do projeto Artes Têxteis Indígenas, contou com a ajuda do sobrinho Frederico Ribeiro, que foi o cinegrafista. Frederico acompanhou a tia em expedições aos Araweté e Asuriní, do Médio Xingu, nos anos 1980.

E, já doente do câncer cerebral, Berta escreveu o livro inédito Índios do Brasil : 500 anos de resistência, que registra toda a informação etnográfica sobre os indígenas brasileiros acumulada por ela ao longo de sua carreira (AMORIM, 1998).

Berta ministrou aulas no curso de Pós-graduação em História da Arte, junto à colega do Museu Nacional Maria Heloísa Fénelon Costa, nas disciplinas de “Arte indígena no Brasil” e “Cultura material e arte étnica”, orientando alunos nos temas de sua especialidade (VAN VELTHEM, 1997 ; AMORIM, 1998). Após ingressar como professora adjunta no Departamento de Antropologia do Museu Nacional, por concurso público em 1988, Berta não foi incorporada por uma questão teórico-metodológica, pois tratava de temas que não estavam alinhados aos interesses da Antropologia feita no Programa de Pós-graduação em Antropologia Social do Museu Nacional, tendo sido mais bem aproveitada na Pós-graduação em História da Arte, da Escola de Belas Artes da UFRJ, uma vez que era especialista em cultura material e artes visuais dos indígenas brasileiros. Heloísa Fénelon era coordenadora da área de concentração em Antropologia da Arte e levou Berta Ribeiro para lecionar na Escola de Belas Artes. Além de pesquisadora e professora de pós-graduação, Berta foi membro da Associação Brasileira de Antropologia (ABA), da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), do Conselho Regional de Museologia do Rio de Janeiro, do Conselho Editorial das revistas Ciências em Museus, Ciência Hoje das Crianças e dos Anais do Museu Paulista ; e foi membro da Comissão Julgadora da seleção para a Pós-graduação em História da Arte, do Mestrado em História e Crítica da Arte, na Escola de Belas Artes (UFRJ). Também desenvolveu pesquisas para a National Geographic Society.

Segundo Amorim (1998), ela recebeu reconhecimento da comunidade antropológica e foi homenageada, em vida, mais de uma vez pela ABA. Em 1995, já doente, foi condecorada comendadora da Ordem Nacional do Mérito Científico, insígnia concedida pelo governo brasileiro a cientistas ilustres. Berta recebeu a Ordem Nacional em sua casa, e pouco tempo depois entrou em coma.

Fig. 6.
Berta Ribeiro com indígenas em trabalho de campo, s/d.
Fonte : Acervo da Fundação Darcy Ribeiro.

“Pessoas com nome, rosto e personalidade definida” : Aspectos colaborativos da prática etnográfica de Berta Ribeiro

Dentre as muitas atividades às quais Berta Ribeiro se dedicou, uma foi a reflexão sobre o papel dos museus. Além de formada em História e Geografia, e ser doutora em Antropologia, Berta possuía registro de museóloga no Conselho Regional de Museologia do Rio de Janeiro, desde o ano de 1986. Segundo Callado (2016, p. 133), tendo se dedicado ao estudo de cultura material, Berta lia os objetos, os colecionava e sobre eles promovia estudos museológicos, porque acreditava que esses estudos poderiam apoiar a causa indígena e via os museus como meio de educação pública. [8] Para Berta, os museus eram instrumentos pedagógicos. Como nos lembra van Velthem (1997), Berta esteve institucionalmente associada ao Museu Nacional e ao Museu do Índio. Museus para os quais ela atuou como pesquisadora, formando coleções. O interesse pela formação de coleções se estendeu ao Museu Paraense Emílio Göeldi, para o qual doou uma importante coleção de objetos dos indígenas Asuriní.

Paralelamente, dedicou-se à promoção e publicação de estudos museológicos sobre esses objetos, pois acreditava que esses estudos permitiriam apoiar a causa indígena, e porque encarava os museus como meio de educação pública (RIBEIRO, Berta G., 1985c). Em maio de 1989, quando planejou o Anteprojeto do Museu de Educação para o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos do Ministério da Educação (MEC), Berta escreveu : “Um museu não é um arquivo morto, uma atividade perdulária, como é geralmente considerado, e sim uma instituição com objetivos didáticos, científicos e político-polêmicos ; ao mesmo tempo que uma área de lazer e reflexão.” [9]A singularidade da produção de Berta Ribeiro sobre os museus como meio de educação pública pode ser vista nos textos : “Museu : Veículo comunicador e pedagógico” (1985c) ; “Museu do Índio, Brasília” (1987b) ; “Museu e Memória. Reflexões sobre o colecionamento” (1989ª) e “Coleções Museológicas : Do estudo à exposição” (1991c).

Além de ter contribuído com o Museu do Índio do Rio de Janeiro, Berta participou ativamente da idealização do projeto do Museu do Índio de Brasília, atual Memorial dos Povos Indígenas, junto com o arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012). Callado (2016) afirma que o projeto conceitual e o detalhamento do que seria o Museu do Índio em Brasília consumiu Berta nos últimos anos de sua vida ativa. No texto “Museu do Índio, Brasília” (1987b) pode-se ler o plano diretor do museu. O artigo, escrito a pedido do Governador do Distrito Federal José Aparecido de Oliveira (1929-2007), foi publicado em 1986 em Cadernos RioArte, da Fundação RioArte no Rio de Janeiro. No plano diretor é possível observar que Berta tinha por intenção preservar, divulgar a cultura indígena e contribuir para a mudança da política indigenista no Brasil, de forma que o assistencialismo eventual desse lugar a soluções efetivas a longo prazo. Para tal, ela se utilizou de suas experiências no Museu Nacional e no Museu do Índio, bem como a experiência da exposição “Índios do Brasil : cultura e identidade” no Museu Pigorini, em Roma, para pensar o projeto do museu e a exposição inaugural.

A formação de acervos de bens materiais dos grupos indígenas que Berta estudava constituía um de seus interesses capitais. Podemos afirmar que ela se identificava com os etnólogos da primeira metade do século XX, porquanto lia os objetos, os registrava com o máximo de detalhes possíveis em sua descrição e catalogação, e os colecionava. Berta formou coleção para o Museu Nacional, no âmbito de sua participação no projeto Etnografia e Emprego Social da Tecnologia Indígena e Popular, financiado pela Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) e coordenado por Maria Heloísa Fénelon Costa, com o subprojeto Corpus Etnográfico do Alto Xingu. Foram coletados, de agosto de 1977 até 1981, cerâmicas, cestarias e armas dos indígenas Wanana, Asuriní, Makú, Baniwa e Kayabí em um momento em que Berta estava começando a estudar as cestarias e o processo de trançados em cipó.

Desses estudos foram publicados os textos : A civilização da palha : A arte do trançado dos índios do Brasil (1980c), tese de doutorado de Berta ; “Possibilidade de aplicação do ‘critério de forma’ no estudo de contatos intertribais, pelo exame da técnica de remate e pintura de cestas” (1980d) ; “O artesanato cesteiro como objeto de comércio entre os índios do Alto Rio Negro, Amazonas” (1981) ; “A Oleira e a tecelã : O papel social da mulher na sociedade Asuriní” (1982) ; A Arte do Trançado dos Índios do Brasil : um estudo taxonômico (1985ª) ; “Tecelãs Tupi do Xingu : Kayabí, Jurúna, Asuriní, Araweté” (1985b) ; “A Arte de Trançar : Dois macroestilos, dois modos de vida” (1986ª) ; “Artes Têxteis Indígenas do Brasil” (1986b).

Através de seus estudos sobre o trançado e a cestaria, Berta buscou “demonstrar que existe uma correlação entre os estilos de trançado e modos de vida [dos indígenas brasileiros]” (RIBEIRO, Berta G., 1986a, p. 283) e que “a arte do tecido alcançou entre nossos índios o mesmo relevo que a do trançado, a arte plumária e a cerâmica” (RIBEIRO, Berta G., 1986a, p. 351). Sobre os padrões ornamentais Kayabí, Berta ainda acrescentou que “o simbolismo de padrões ornamentais presentes em alguns artefatos Kayabí (trançados, cuias pirogravadas, bordunas) e na sua pintura corporal, participam da natureza de insígnias de identificação tribal, tendo função mnemônica bem definida.” (RIBEIRO, Berta G., 1986b, p. 265).

Ainda sobre as coleções que formou para museus brasileiros, e nomeadamente para o Museu do Índio, Berta formou uma coleção de 26 itens dos indígenas Araweté, do Pará, entre maio de 1981 e 1985, composta por cerâmicas, trançados diversos (cestos, ralador, peneira, abano), utilitários (pente, saias, ralador, fusos e adornos), objetos rituais como patuás, e armas (flechas). A coleção doada para o Museu Paraense Emílio Goeldi é composta por 44 objetos diversos dos indígenas Asuriní, coletados, em 1981, no Igarapé Ipiaçava, afluente do Xingu, no Pará. Ela é composta por adornos (colares, braçadeiras, tembetás [10] de osso, tornozeleiras, cintos, tipoias, pulseiras e diadema).

Foto registrada por Bianca Luiza Freire de Castro França
Fig. 7.
Cerâmica dos indígenas Araweté do Pará coletada entre 1981 e 1985 por Berta Ribeiro para o Museu do Índio do Rio de Janeiro, 2022.

As coleções de Berta Ribeiro são formadas a partir de objetos do dia a dia, que demonstram as práticas produtivas e sociais dos indígenas, somada a descrição minuciosa que fazia dos objetos coletados, a fim de estudá-los e registrar a tecnologia indígena empregada na produção desses objetos. Mais do que uma abordagem estética da produção material dos povos indígenas, Berta tinha preocupação com a dimensão tecnológica e utilitária, o que era marcado pelo materialismo cultural norte-americano, de Julian Steward e Leslie White, das décadas de 1940 e 1950 (FRANÇA, 2023, p. 227-229). Berta faz parte do hall de antropólogas que, ao longo do século XX, se dedicaram à cultura material dos povos indígenas brasileiros e foram precursoras da vertente atual que prega a simetria nas relações com interlocutores indígenas. Nomes que não devem ser esquecidos, como : Heloísa Fénelon, Lucia Van Velthem, Lux Vidal, Sonia Dorta, Regina Polo Müller, dentre outras.

No contexto colaborativo de obtenção de peças para as coleções de museus, podemos observar em sua obra e na forma pela qual descrevia os objetos, sempre apresentando os nomes dos artesãos que os produziram, que Berta não centralizava o trabalho de coleta em si, mas que havia diálogo direto com as comunidades indígenas com as quais trabalhou. Dentre seus interlocutores locais podemos apontar os indígenas do povo Desana, Firmiano e Luiz Lana, com os quais Berta editou o livro Antes o Mundo Não Existia, já citado anteriormente. Podemos situar Berta Gleizer Ribeiro como uma precursora da vertente antropológica que prega a simetria nas relações com interlocutores indígenas, porque antes de Berta, pelo menos no Brasil, não há registros de antropólogo que tenha cedido a autoria de uma obra colaborativa aos indígenas, como é o caso de Berta com os Lana em Antes o Mundo Não Existia. Lúcia Van Velthem que foi amiga e influenciada por Berta diz que :

Ainda entre os Desana, ela foi extremamente pioneira no reconhecimento do Firmiano Lana, enquanto um artista plástico e ilustrador da mitologia. Hoje em dia também, temos vários artistas plásticos... eles estão na Bienal de São Paulo, né ? Eles são reconhecidos... a Daiara Tukano, tem um Macuxi (Jaider Esbell), um Baniwa do rio Negro, (Denilson Baniwa). E a Berta... ela foi pioneira precursora nesse sentido... de dar voz nessa apresentação. Se não me engano a primeira publicação do Lana, dos grafismos indígenas foi em 1992. Se não me engano... Nesse campo, ela foi pioneira. Aquilo frutificou. Mas pouca gente remete a esse feito base, né ? Exceto aos Narradores Indígenas... isso esses, sim, são mencionados. A outra contribuição da Berta, que eu considero pioneira. Ela, em 1989, publicou Arte Indígena e Linguagem Visual onde ela demonstra que toda atividade indígena está impregnada de um senso estético. É óbvio que o livro dela está inserido no tempo em que ele foi editado, concebido... em que as artes indígenas eram vistas como artes visuais. Como formas de linguagem... ligadas a uma forma de comunicação. Mas de qualquer forma, esse livro é um marco inicial para os futuros estudos sobre as artes indígenas. E o segundo, vem logo depois, que é O Grafismo Indígena, de 1992. Mas ela está no início disso. Mas o dela... eu considero um marco inicial de todo esse movimento que desembocou nesses estudos das artes indígenas. 
As outras contribuições... bem, é claro que eu não poderia deixar de falar... eram contribuições diversificadas, aprofundadas de Berta no campo da cultura material. Ela fez várias pesquisas no Xingu, no rio Negro, no Maranhão... eu esqueci de mencionar, eu falei que esse livro era o marco inicial, ele é o marco inicial enquanto, digamos, metodologia, abrangência, estabelecimento das fronteiras desses estudos das artes indígenas. Por outro lado, as artes indígenas têm naquele livro da Arte Plumária Kaapor, aquele sim, também dela... com o Darcy. Esse também. Muito embora, não foi nem Berta e nem Darcy quem cunhou o termo Arte Indígena. Foi o Gastão Cruls. (FRANÇA, 2023, p. 270-271)

Berta muito contribuiu para os estudos de cultura material indígena, principalmente sobre a Tecnologia Indígena, a partir de seu esforço para distinguir a que etnia corresponderia cada artefato no circuito de trocas, ou como o mesmo tipo de artefato era diferentemente confeccionado e os significados das peças para os grupos. A ciência da escrita de Berta é, antes de tudo, produção de documento histórico sobre os povos indígenas brasileiros. Como mantinha uma relação diferente com seus interlocutores indígenas, relação de colaboração e não apenas de meros informantes, Berta registrava os objetos da forma mais detalhada possível, com o registro do nome e etnia de seus artesãos, além do local exato de coleta. É possível observar nos textos advindos de suas pesquisas em campo, que assim como os objetos coletados e registrados com enorme detalhe e zelo. Berta coletava objetos e informações sobre determinado período da história e cultura dos indígenas que estudou e tinha consciência que os objetos e seus estudos eram recortes de culturas muito mais complexas, talvez por isso registrava o nome dos artesãos e o local de coleta bem referenciado, para que os objetos fossem contextualizados na vida social dos indígenas que os produziram (“feito pelo artesão X, na aldeia Y, no período B na história e cultura desse povo”).

Ela pode ser considerada uma boa etnógrafa porque seu trabalho cumpre as três condições fundamentais apontadas por Peirano (2014, p.386) para uma boa etnografia : a) considera a comunicação no contexto da situação ; b) transporta, de maneira feliz, para a linguagem escrita o que foi vivido intensamente na pesquisa de campo, transformando experiência em texto ; e c) detecta a eficácia social das ações de forma analítica.

Berta dava muita ênfase à autonomia dos povos indígenas com os quais trabalhou. Acreditava que a manutenção de práticas culturais distintivas era a única saída para esses povos. Segundo Botelho (2005), a antropóloga tinha interesse pelo “sabor do saber indígena” e possuía uma habilidade para o trabalho que reunia diferentes sujeitos de conhecimento, incluindo nativos e antropólogos. Berta possuía interesse pelo saber indígena enquanto : a) conhecimento indígena sobre a natureza e para “humanização da natureza” (práticas e cosmologias) – Homo Ludens ; b) conhecimentos antropológicos sobre os saberes e modos de fazer indígenas : gestos complexos e movimentos do trabalho artesanal, onde a cultura material é vista enquanto tecnologia – Homo Faber. Em “O índio brasileiro : Homo faber, Homo ludens” (1983b), Berta Ribeiro baseando-se em Morgan (1877) e sua divisão da produção humana em instrumentos de trabalho, para provimento da subsistência ; instrumentos de guerra e utensílios de conforto (dormir, sentar e abrigo) diz que a face lúdica do indígena brasileiro é aquela das atividades dedicadas à dança, canto, ornamentação do corpo e dos artefatos, enquanto sua face Homo Faber é sua especialidade, o legado indígena à cultura brasileira e universal, que é o saber, o conhecimento da natureza e do comportamento técnico do indígena. Para distinção dos utensílios, instrumentos e máquinas, dialoga com Marcel Mauss (1967) e compreende como instrumentos de caça, pesca e guerra as armas de peso como as bordunas ; como utensílios de defesa as armas contundentes como as lanças ; o escudo como utensílio de defesa e as armadilhas como máquinas.

Em sua tese sobre a ‘Civilização da Palha’ (1980c), Berta afirma que o trabalho artesanal é, na verdade, um complexo de gestos e movimentos. Ao etnólogo cumpre registrá-los com a maior acuidade possível. E ao tratar dos meios da produção indígena se referia a uma “TecEconomia” (RIBEIRO, Berta G., 1986g, p. 12) e não à tecnologia, pois as ferramentas isoladas não fazem uma tecnologia. O termo TecEconomia não inclui somente as máquinas e ferramentas utilizadas por certa cultura, mas também a forma pela qual elas são organizadas para uso e mesmo o conhecimento científico que as torna possíveis.

A classificação adotada em seu trabalho dava importância para a tecnologia e o estudo da evolução tecnológica para a compreensão da vida material de diferentes sociedades humanas. Seu trabalho dava valor à tecnologia produtiva como forma de adaptação ecológica, coesão social e sustentação identitária. Nas suas obras, Berta citava autores voltados para os estudos da Ecologia e da adaptabilidade humana, tais como : a) Julian Steward, que foi organizador do Handbook of South American Indians (1948 a, 1948b) (que no Brasil teve sua versão atualizada como a Suma Etnológica Brasileira coordenada por Berta e Darcy Ribeiro) ; b) Charles Wagley (1913-1991), com quem Berta mantinha correspondência ; c) Roquette-Pinto (1884-1954) ; d) Castro Faria (1913-2004), que contratou Berta para o Museu Nacional, na década de 1950 como Naturalista ; e) William Balée (1954 - ) ; f) Emílio Moran (1946 - ) g) Darrel A. Posey (1947 – 2001).

Essa dimensão voltada para a valorização da tecnologia produtiva como forma de adaptação ecológica, coesão social e sustentação identitária é possível ver no texto “Artesanato indígena : para que e para quem ?” (1983a), quando, ao abordar a produção mercantil do artesanato indígena, diz que a introdução do uso de materiais heteróclitos como miçangas, anilinas e fios industriais para produção mercantil de objetos religiosos e cerimoniais desmistifica o código simbólico e a cosmovisão a eles associados. Mas, apesar de tais malefícios, entre muitos outros que são apontados, como a desigualdade entre retribuição e pagamento versus tempo e esforço de produção do artesanato, Berta salienta que a destinação mercantil salvou, em vários casos, o artesanato de diversos povos, como reforço de identidade étnica.

Também interessava a Berta Ribeiro as manifestações explícitas que revelam a influência indígena na cultura nacional. Para isso, ela vai tratar da formação histórica das “subculturas” regionais e da presença indígena, maior ou menor, em cada uma delas ; e descrever os modos de produção e de transferência de técnicas adaptativas que incluem os modos de fazer, instituições, conhecimentos e crenças, diante do contato interétnico e da miscigenação. Isso pode ser observado no capítulo “Nossa Herança Indígena” [11], do livro O Índio na História do Brasil, de 1983 e no capítulo “Subculturas, técnicas, sabor e saber” (1987e, p. 95-173), do livro O Índio na Cultura Brasileira, de 1987.

Berta irá examinar o legado indígena presente no cotidiano do povo brasileiro. Sua proposta era explicitar a contribuição do indígena não só na questão da domesticação de plantas, mas de inúmeros outros aspectos da vida cotidiana. Berta discorre sobre o manejo da natureza por parte dos grupos indígenas para dela extrair o necessário para a vida. Mas também trata da cultura indígena no Brasil moderno : o conhecimento da flora e fauna, das técnicas agrícolas e artesanais, da culinária, da arquitetura, da medicina tradicional e do folclore nacional. Seus escritos sobre a temática da influência indígena na cultura nacional têm preocupação política bem definida : fazer valer os direitos históricos dos indígenas, que são, até os dias de hoje, negados.

As artes visuais dos indígenas brasileiros

As artes indígenas representaram um interesse duradouro na obra de Berta Ribeiro. Em suas obras sobre Arte Visual Indígena eram enfocadas diferentes categorias, na época percebidas como sendo as que expressavam uma maior carga simbólica e estética : pintura corporal, adornos plumários, máscaras e objetos rituais, instrumentos musicais e, sobretudo, os grafismos ou desenhos semânticos. Sob o ponto de vista de Berta, o foco da análise não seria a valorização das dimensões estéticas ou a sua descrição formal, mas as relações entre expressão formal e conteúdo (significado), pois estas remeteriam a outros referentes como organização social, mitologia e os papéis rituais que podem ser interpretados segundo o contexto cultural em que se inserem.

A consideração das relações que envolvem os objetos, como proposto por Berta, constitui um enfoque que permanece válido e valorizado nos estudos contemporâneos da Antropologia da materialidade. Na atualidade, um dos vieses de compreensão do tema abrange de forma mais expandida um universo variado, como é evidenciado pela “virada ontológica” (LAGROU e van VELTHEM, 2018, p. 135). A virada ontológica aparece na obra de Alfred Gell, Arte e Agência (1998), que é considerada precursora, pois contribui para recolocar no centro da Antropologia a atenção para diferentes relações possíveis entre humanos e não humanos, pessoas e coisas, entre corpos e imagens. Gell sugere que artefatos sejam tratados como pessoas, como agentes inseridos em redes relacionais ; nessa perspectiva, as intenções humanas podem ser abduzidas a partir da agência dos artefatos que produzem ou concebem.

No texto introdutório do volume 3 da Suma Etnológica (1986g, p. 15-27), Berta destaca que o estudo do signo na Arte contribui para um campo mais amplo que passou a se chamar linguagem visual. Afirma que essa linguagem é particularmente conectada aos sistemas gráficos, que constituiriam mecanismos de ordenação e de comunicação de experiências, culturalmente determinadas. A concepção da arte dos povos indígenas enquanto uma linguagem visual permeia as abordagens de Berta Ribeiro ao longo de sua carreira, onde é destacado que o objeto de arte se confunde com o utilitário, pois a arte impregnaria todas as esferas da vida do indígena brasileiro, refletindo um desejo de fruição estética e de comunicação de uma linguagem visual. Esse campo pouco explorado pela etnologia indígena [12] se volta para a análise da cultura material dos indígenas do Brasil de um ponto de vista estético, ou de documentos etnográficos com conteúdo artístico, relacionados ao plano mítico e à estrutura social.

É sob a ótica que considera as manifestações estéticas indígenas como um sistema de comunicação que Berta Ribeiro vai analisar em suas obras Arte Indígena, linguagem visual (1989b) ; “Arte gráfica Juruna” (1984a) ; “Arte gráfica Kadiwéu” (1984b) ; “Desenhos Semânticos e Identidade Étnica : O caso Kayabí” (1986f) ; “A Mitologia Pictórica dos Desâna” (1992a) ; “Os Padrões Ornamentais do Trançado e a Arte Decorativa dos Índios do Alto Xingu” (1983a) os exemplos oferecidos pelas pesquisas etnológicas realizadas em diferentes regiões do Brasil. Apoiando-se em autores como Claude Lévi-Strauss, Néstor Canclini, Franz Boas e Pierre Bourdieu, ela avança nos pressupostos básicos do objeto de arte, que, de seu ponto de vista, se ancorariam no domínio técnico da matéria-prima, ao qual se agregaria a existência de um estilo, de uma intenção estética.

Valendo-se de inúmeros exemplos etnográficos, sobretudo vinculados aos povos amazônicos, Berta destaca que um mesmo padrão geralmente tem interpretações diferenciadas, dependendo da cultura ao qual está vinculado. Apoiando-se na complexa cestaria dos indígenas Kayabí, sugere a existência de categorias visuais, com expressão simbólica e função mnemônica, as quais configurariam um sistema que, ao correlacionar formas e significados, funcionaria como iconografia (RIBEIRO, Berta G., 1986f)).

A temática da linguagem visual também é encontrada quando Berta aprecia o tratamento com o corpo, presente na pintura corporal e nos adornos (RIBEIRO, Berta G., 1989b, p. 80-102). Para a autora, estes funcionariam como uma marca de identificação étnica e como indicadores do gênero, faixa etária e condição social de um indivíduo. Evidenciariam o significado profundo de caracterização de uma pessoa e como essa refletiria seu grau de socialização. Nesse sentido, Berta aponta para o fato de que um dos aspectos principais da concepção indígena sobre a corporalidade é a sua fabricação social envolvendo a comunidade, e que essa percepção corporal não se trataria de uma entidade biológica que cresce de forma autônoma, mas de uma construção social.

Retomando a questão do campo da materialidade, no livro Arte indígena, linguagem visual (1989b), Berta se propõe a discutir “não a homologia existente entre o rito e o mito, mas a fundamentação mítica de objetos rituais” (RIBEIRO, Berta G., 1989b, p. 103). Destaca que os artefatos estão imbuídos de significados simbólicos e mensagens que cabem ao etnólogo decodificar. A autora indica que os artefatos usados nos rituais proporcionam informações de caráter sociológico e mítico religioso ; portanto, “essa linguagem visual ou iconográfica, entranha um conteúdo semântico, estético e estilístico que expõe a cosmovisão tribal” (RIBEIRO, Berta G., 1989b, p. 113). Ou seja, a atividade ritual, a partir de seus conteúdos simbólicos e estéticos, conforma e comunica uma identidade pessoal, social e étnica do indivíduo que se expressaria como uma linguagem, uma “arte indígena” que possui um “caráter de linguagem visual e de sistemas de comunicação social às manifestações artísticas tribais em quase todos os domínios de expressão estética” (RIBEIRO, Berta G., 1989b, p. 120-121).

Ecologia e Adaptabilidade humana

Além da tecnologia, Berta tinha interesse pela Etnobotânica e pela Ecologia. Em 1959, publicou o texto, em coautoria com J. C. de Melo Carvalho, “Curare : A Weapon for Hunting and Warfare”. O texto é resultado de sua contribuição ao Seminário Internacional de Curare e Substâncias Curarizantes, no Museu Nacional. Nesse texto, Berta já demonstra enorme interesse sobre os conhecimentos de Etnobotânica dos indígenas brasileiros, bem como sua popularização. Seu livro Amazônia Urgente : cinco séculos de história e ecologia [13], de 1990, é ao mesmo tempo um guia da exposição ‘Amazônia Urgente’, montada na estação de metrô do Largo da Carioca, no Rio de Janeiro. O livro constitui um enorme esforço para tornar visível a história e drama da floresta amazônica e seus povos indígenas. Traz ideias claras sobre o equilíbrio ecológico ameaçado pelo progresso não adaptado. Utiliza uma abordagem interdisciplinar que integra as Geociências, as Biologias, a Antropologia e a História ambiental e que aventa alternativas de manejo autossustentável para a Amazônia.

Já no texto “Ao vencedor as batatas !” (1991b), Berta traz um trabalho de análise do conhecimento dos indígenas sobre o manejo dos vegetais e sobre o saber Etnobotânico, temas preciosos para a Antropologia Ecológica. Berta trata dos conhecimentos dos indígenas acerca da flora e dos usos das plantas desde aquelas destinadas à alimentação como frutas, raízes e vegetais diversos, bem como as plantas medicinais, alucinógenas, fibras têxteis, plantas tintórias, como o anil ; plantas de uso industrial como a seringueira, dentre outras muitas variedades que servem aos saberes etnobotânicos dos indígenas brasileiros.

No Brasil, antes de Berta Ribeiro, já iam longe os estudos sobre adaptabilidade humana aos trópicos úmidos (MORAN, 1994), na produção dos séculos XIX e XX. No ramo da Antropogeografia, podemos citar nomes como Edgard Roquette-Pinto (1884-1954) e Raimundo Lopes (1894-1941) (ALMEIDA e DOMINGUES, 2010) ; no ramo da Ecologia Cultural podemos citar de forma direta Charles Wagley (1913-1991), Eduardo Galvão (1921-1976) e Luís de Castro Faria (1913-2004) (FARIA 2018). Estes homens levavam em consideração os saberes indígenas e sua contribuição para a sociedade brasileira. Valorizavam o “saber-fazer” indígena e as relações culturais/sociais que estabeleciam diferentes grupos em lugares diversos. Podemos citar também a obra de Gastão Cruls (1888-1959), contemporâneo de Raimundo Lopes, porém, diferente de Raimundo Lopes, já que se tratava de um naturalista viajante que dedicou, em A Amazônia que eu vi, de 1938, uma parte inteira aos saberes indígenas.

Berta militava a favor da proteção dos ecossistemas e das populações amazônicas tratando de pautas ecológicas, sociais e políticas como as invasões de territórios indígenas, os desmatamentos e queimadas, o garimpo ilegal e outros ilícitos que continuam afligindo a Amazônia até a nossa contemporaneidade. Por isso, o trabalho de Berta Ribeiro propicia fecundas conexões e diálogos com a Antropologia contemporânea, oferecendo reflexões e práticas inspiradoras.

Em uma entrevista ao Programa “Tome Ciência”, da SBPC, quando em 1988 recebeu o Prêmio ’Erico Vanucci Mendes’ para trabalhos de Preservação da Memória Nacional, Tradições Populares e Traços Culturais durante a 40a RASBPC, Berta afirmou que considerava os povos indígenas brasileiros como “civilizações vegetais”. Para justificar seu pensamento, citou o trecho do Sermão da Epifania, de 1662, professado na Capela Real em Lisboa, pelo Padre Antonio Vieira : “Uma árvore lhes basta para o necessário da vida : com folhas se cobrem, com frutos se sustentam, com ramos se armam, com os troncos se abrigam e sobre a casca navegam.”

Os trabalhos de Berta Ribeiro que têm como foco a adaptabilidade humana ao meio ambiente, entre os povos indígenas, em especial aqueles que tratam do domínio da fauna e flora nos trópicos úmidos, bem como, do manejo agrícola e hídrico, destacam como esses conhecimentos podem ser empregados para a melhoria da vida em sociedade e na preservação ambiental. Berta também assumia o determinismo tecnológico em sua obra, mas, ao invés de falar de tecnologia, ela preferia – como atrás referido – o conceito de TecEconomia, aplicado ao conhecimento e classificação das matérias-primas e às técnicas empregadas, bem como à divisão do trabalho, tempo dedicado à atividade artesanal, escambo intra e intertribal e com a sociedade nacional (RIBEIRO, Berta G., 1986g).

A partir dessas e de outras referências, é possível conectar as assertivas de Berta Ribeiro, formuladas no século XX, aos estudos antropológicos contemporâneos, relacionados à vida vegetal. Constata-se que, dos vários trabalhos da autora, emerge a latente compreensão de que certos “processos do desenvolvimento humano oferecem hipóteses para pensar o modelo de vida a partir e com as plantas” (SHIRATORI, 2020, p.6).

Reflexões finais sobre o legado de Berta G. Ribeiro

Berta Ribeiro descreveu os modos de produção e de transferência de técnicas adaptativas que incluem os modos de fazer, as instituições, os conhecimentos e as crenças, que seriam resultantes do contato interétnico e da miscigenação, aspectos apresentados nos livros O índio na História do Brasil (1983g) e O índio na cultura brasileira (1987e), ambos textos essencialmente didáticos e com finalidade de divulgação científica que foram feitos com foco no público dos professores secundaristas. No prefácio do último, a autora enfatiza o que considera o legado indígena no que é considerado primordial e permanente : o amor, o respeito e a humanização da natureza enquanto fonte de recursos. Essa perspectiva é evidenciada na primeira parte do livro, subdividida em “A natureza humanizada”, dedicado à Etnobotânica, e “A natureza domada”, dedicada à Etnozoologia.

Na obra de Berta Ribeiro, a Ecologia [14] é sempre destacada e, assim, observamos o imenso interesse pelas técnicas agrícolas, que na Amazônia dão ênfase à cultura de tubérculos, como mandioca e batata-doce. Há uma intensificação da agricultura com uma abordagem da prática da lavoura múltipla (RIBEIRO, Berta G., 1987c) e o maior uso de tecnologias apoiadas em ferramentas e no domínio da terra e das águas dos rios e das chuvas. Para Berta, o desafio imposto pela floresta tropical consiste na necessidade de torná-la mais produtiva, sem destruir a diversidade e infinidade de formas de vida existentes.

Antecipando debates atuais referentes à conservação da biodiversidade florestal, a obra de Berta Ribeiro mostra o quanto os saberes dos povos indígenas têm muito a nos ensinar sobre a sustentabilidade, o convívio com o meio-ambiente e o respeito à natureza. Esses aspectos dialogam com o desafio que se coloca na atualidade, que é representado pelo pensar a floresta amazônica como um nexus de relações materiais e imateriais, entre uma infinidade de formas de vida, além de assegurar as condições materiais de seus habitantes.

Podemos concluir que a obra de Berta Ribeiro tem importantes contribuições para os estudos de Cultura Material, Arte Visual e Adaptabilidade Humana que foram feitos no Brasil no século XX. Berta utilizava os estudos de cultura material e arte visual dos povos indígenas brasileiros como fio condutor para a compreensão e apreensão das tecnologias empregadas por esses indígenas a fim de propor para a sociedade brasileira, de forma geral, o uso social dessa tecnologia indígena para a obtenção de meios mais sustentáveis de viver e coexistir na natureza, explorando seus recursos. O uso social da tecnologia indígena sugerido na obra de Berta Ribeiro é sua grande contribuição para a sociedade, de forma geral, pois ela aponta e analisa as crises da exploração desenfreada do meio-ambiente e seus recursos e traz como solução a adoção de técnicas de adaptabilidade humana à natureza que são utilizadas de forma bem-sucedida pelos povos indígenas brasileiros.

Referências

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[1Bianca França é historiadora ; Doutora em História, Política e Bens Culturais (PPHPBC/FGV) ; Mestre em Preservação de Acervos de Ciência e Tecnologia (PPACT/MAST) ; Licenciada em História (UNIRIO) ; com especialização em Sociologia (UCAM) e Docência com Ênfase na Educação Básica (IFMG/Arcos). Email : bianca.castro.franca@gmail.com. ORCID : https://orcid.org/0000-0001-8326-3559

[2O PPGAV-UFRJ teve origem em 1985, quando foi implantada a primeira turma do então Mestrado em História da Arte. Tratava-se, nessa área, do primeiro curso stricto sensu no estado do Rio de Janeiro e um dos mais antigos do país, atendendo a uma demanda significativa de especialistas e estudiosos de artes visuais. Criava-se o curso com área de concentração em História e Crítica da Arte, cuja linha de pesquisa voltava-se principalmente para os estudos em história da arte brasileira. A partir de 1989 foi estabelecida uma segunda área de concentração, a de Antropologia da Arte, agregando pesquisas acerca das produções artísticas registradas no âmbito da cultura de massa e da cultura popular. Em 1996, por sua vez, foi criada a área de Linguagens Visuais, por meio da qual se abria espaço no Programa para pesquisas teórico-práticas, enfatizando o processo de criação e reflexão sobre a arte contemporânea. Para saber mais sobre o PPGAV-UFRJ, ver em : https://www.ppgav.eba.ufrj.br/programa/historico. Acesso em : 09 de novembro de 2023.

[3RIBEIRO, Berta G. (1980b)

[4Amadeu José Duarte Lanna (1933-2020) : Formado em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, em 1955. Ministrou aulas para o curso de especialização em Antropologia, que originou o Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e na Universidade Estadual de São Paulo. Lanna esteve no Alto Xingu nos anos 1960 e conviveu com a crise demográfica dos indígenas Kisêdjê. Ver mais em : Obituário. Folha de São Paulo, 2020. Disponível em :
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[5O conceito de transfiguração étnica que é apresentado no livro Os índios e a civilização, publicado na década de 1970, é a forma pela qual os povos surgem e se transformam através de forças biológicas, como as doenças e mudanças genéticas, e ecossociológicas, que são as mudanças de seu habitat e tecnologias produtivas (ex. o afastamento dos povos indígenas de suas terras devido à ocupação do agronegócio). O antropólogo João Pacheco de Oliveira (2020) apresenta uma análise sobre o conceito, afirmando que deve ser entendido não como um estado, mas como um processo adaptativo pelo qual os indígenas que sobrevivem ao extermínio permanecem indígenas “já não nos seus hábitos e costumes, mas na auto-identificação como povos distintos do brasileiro e vítimas de sua dominação” (RIBEIRO, Darcy, 1977, p. 8 apud PACHECO DE OLIVEIRA, 2020, p. 28)

[6Maria Heloísa Fénelon Costa : pesquisadora, especialista em arte indígena, formada em Belas Artes. Foi curadora do Setor de Etnologia e Etnografia do Museu Nacional entre 1961 e 1986. Ver FARIA (1996)

[7Antonio Carlos de Souza Lima : Antropólogo brasileiro, Professor Titular (aposentado) de Etnologia/Depto. de Antropologia, Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ. Foi presidente da Associação Brasileira de Antropologia (2015-2016). Para saber mais, ver em : http://ppgas.museunacional.ufrj.br/lima.html. Acesso em : 09 de novembro de 2023.

[8A frase “Pessoas com nome, rosto e personalidade definida” surge em Diário do Xingu (RIBEIRO, Berta G., 1979b), Berta trata os indígenas não como informantes, apenas. Mas os apresenta como pessoas com nome, rosto e personalidade definida, de quem a autora capta o modo de ser e de viver, organizando seus dados de maneira a oferecer informações precisas filtradas por seu modo de vê-las e senti-las.

[9Ministério da Educação. Anteprojeto do Museu de Educação para o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos do Ministério da Educação. Maio de 1989.

[10Tembetá : Definição “Do tupí e do guaraní (...) composto de tembé, seu lábio inferior, e itá, pedra. (...) Tornou-se costume chamar de tembetá todo o objeto duro e inflexível que os índios introduzem no furo artificial do beiço inferior, com exceção do botoque. O tembetá, quanto sabemos até agora, é privilégio exclusivo do sexo masculino. Em geral, a sua forma e a espécie de material (osso, concha, pedra, resina endurecida e madeira) variam segundo a idade do portador.” (RIBEIRO, Berta G., 1988c, p. 183).

[11RIBEIRO, Berta G. (1983g, p.87-109)

[12Maria Heloísa Fénelon Costa desenvolveu este viés. Para saber mais sobre sua trajetória ver : VELOSO Jr. (2021)

[13RIBEIRO, Berta G. (1990 c)

[14Ecologia no sentido do estudo das relações que seres vivos estabelecem entre si e com o meio em que vivem.