Nimuendajú e o Museu Etnológico de Berlim: história de uma coleção (quase) esquecida
Peter Schröder
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife, Brasil
2019
To cite this article
Schröder, Peter,
2019.
“Nimuendajú e o Museu Etnológico de Berlim: história de uma coleção (quase) esquecida”, in
BEROSE International Encyclopaedia of the Histories of Anthropology, Paris.
This work is about the history of a collection of ethnographic objects from the Canela-Ramkokamekrã at the Ethnological Museum in Berlin-Dahlem. Collections with Canela objects exist in several museums, but in this case the peculiarity has to do with both the collector and the conditions in which the collection was organized. For a long time there was no certainty about the places in Europe where the collections organized by the Brazilian ethnologist of German origin Curt Nimuendajú (1883-1945) are deposited. The existence of the collection in Berlin was confirmed in 2010. Nimuendajú’s 1935 letters to Walter Krickeberg (1885-1962) were found in the museum archives, in which he not only offered a collection of 225 objects from the Ramkokamekrã, but also described the conditions of field research partly funded by the museum. The documentation allows us to put in perspective a series of contemporary presuppositions about collecting practices of the time, inviting us to look more attentively at the personalities of collectors.
Este trabalho é sobre a história de uma coleção de objetos etnográficos dos Canela-Ramkokamekrã no Museu Etnológico em Berlim-Dahlem. Coleções com objetos dos Canela existem em diversos museus, porém neste caso a peculiaridade tem a ver tanto com o colecionador quanto com as condições em que ela foi organizada. Por muito tempo não havia certeza sobre os locais na Europa onde as coleções organizadas pelo etnólogo brasileiro de origem alemã Curt Nimuendajú (1883-1945) se encontram depositadas. A existência da coleção em Berlim foi confirmada em 2010. Nos arquivos do museu foram encontradas cartas de Nimuendajú para Walter Krickeberg (1885-1962), de 1935, nas quais ele não só ofereceu uma coleção de 225 objetos dos Ramkokamekrã, mas também descreveu as condições da pesquisa de campo parcialmente financiada pelo museu. A documentação permite relativizar uma série de pressupostos contemporâneos sobre as práticas colecionistas da época, obrigando a lançar olhares mais atentos sobre as personalidades dos colecionadores.
O Museu Etnológico de Berlim fica no sudoeste da cidade, no bairro aprazível de Dahlem. Ele forma, junto com o Museu de Arte do Extremo Oriente (Museum für Ostasiatische Kunst), o Museu de Arte Indiana (Museum für Indische Kunst) e o Museu das Culturas Europeias (Museum für Europäische Kulturen), o complexo museal Museus Dahlem – Arte e Culturas do Mundo (Museumskomplex Dahlem – Kunst und Kulturen der Welt) [2] . Com um total de 508.000 objetos etnográficos e arqueológicos, 140.000 documentos sonoros etnomusicológicos, 20.000 filmes etnográficos e cerca de 200.000 páginas de documentos escritos, o Museu Etnológico é considerado um dos maiores de sua categoria no mundo inteiro, e na Europa talvez seja o maior (König 2003: 8). Quem já entrou nos labirintos de corredores, escadas e salas, que ocupam um quarteirão inteiro, e, em particular, no enorme depósito, onde estão guardados os objetos de todas as partes do mundo em armários e estantes, nunca o esquecerá. Atualmente o museu encontra-se fechado (desde janeiro de 2017) devido à transferência das coleções para o Humboldt Forum no centro da cidade.
Das grandes coleções americanistas fazem parte cerca de 35.000 objetos das terras baixas da América do Sul, principalmente da Amazônia, do Gran Chaco, da Patagônia e da Terra do Fogo. Como organizadores importantes de coleções de origem brasileira podem ser citados Paul Ehrenreich (1855-1914), Theodor Koch-Grünberg (1872-1924), Wilhelm Kissenberth (1878-1944), Max Schmidt (1874-1950) e Emil Heinrich Snethlage (1897-1939), [3] sendo que a maior dessas coleções, com mais de 2.400 objetos, é a de Snethlage. As atividades colecionistas de etnólogos alemães no Brasil foram tema de uma exposição do museu em 2002/03 com o título “Alemães no Amazonas – pesquisadores ou aventureiros? Expedições no Brasil, 1800 a 1914” (catálogo de exposição: Staatliche Museen zu Berlin, 2002). Esta fase colecionista chegou ao fim com a Segunda Guerra Mundial.
No Ethnologisches Museum também se encontra uma coleção menor de objetos dos Canela-Ramkokamekrã, organizada, em 1935, pelo etnólogo brasileiro de origem alemã Curt Nimuendajú (1883-1945). Em termos quantitativos, ela não representa nem um décimo da coleção de Snethlage, o que não significa que seja desinteressante. Pelo contrário, a história dessa coleção permite lançar um olhar sobre práticas etnológicas colecionistas da época, além de ser uma pequena contribuição para pesquisas sobre a história da antropologia brasileira, já que o próprio organizador da coleção é uma das figuras mais destacadas da fase pioneira da etnologia indígena no Brasil.
A coleção dos objetos dos Ramkokamekrã tinha ficado um pouco esquecida no próprio museu, e quando realizei uma visita, em fevereiro de 2011, os registros catalográficos ainda não tinham sido digitalizados. Na realidade, não se tratava, naquela altura, de uma coleção totalmente desconhecida no Brasil ou completamente esquecida, pois havia indícios diretos de sua existência em cartas de Nimuendajú a Carlos Estevão de Oliveira, datadas de 2 de julho, 21 de agosto e 31 de agosto de 1935, editadas por Thekla Hartmann (Nimuendajú, 2000: 231, 239, 240). Contudo, não havia certeza de que a coleção ainda existisse, porque podia ter sido ao menos parcialmente destruída durante a guerra.
O tema deste artigo está relacionado com uma pesquisa sobre as relações de Nimuendajú com os museus etnológicos na Alemanha, nas décadas de 1920 e 1930 [4]. Enquanto Grupioni (1998: 164) ainda observou, há duas décadas, que “pouco se sabe dessa faceta [de colecionador] das atividades de Nimuendajú, não havendo mesmo uma relação dos museus onde suas coleções estão depositadas”, hoje em dia é possível afirmar que todas as coleções etnográficas organizadas por Nimuendajú para museus etnológicos alemães foram localizadas. Elas encontram-se depositadas em museus etnológicos de cinco cidades: Berlim, Dresden, Hamburgo, Leipzig e Munique (Schröder, 2011). Além disso, há objetos colecionados por ele noutras cidades, sendo, porém, conjuntos menores, destinados a complementar outras coleções, ou objetos adquiridos pelos museus por permuta com outros.
Coleções etnográficas como a dos Ramkokamekrã em Berlim podem ser objeto de interesse antropológico e museológico sob diversos pontos de vista, porque geralmente têm uma história peculiar. Elas nos podem falar não só dos próprios objetos e de suas relações com as pessoas que os fabricaram e eventualmente usaram, mas também sobre os critérios das pessoas que os selecionaram. Dependendo das circunstâncias em que tais coleções foram organizadas e das fontes que documentam os processos de sua composição, pode ser possível tirar conclusões sobre os interesses dos museus em adquirir os objetos, sobre os colecionadores, as condições de aquisição e organização e também sobre os pressupostos teóricos dos cientistas envolvidos. Até as modalidades de cooperações internacionais podem ser reveladas.
A coleção de Nimuendajú em Berlim oferece uma boa oportunidade para estudar esses assuntos de um ponto de vista histórico. E é por este motivo que a abordagem para estudar a história da coleção em questão é uma combinação de abordagens antropológicas e históricas.
Os atores e as fontes
A história deste trabalho tem três protagonistas: além de Nimuendajú, Walter Krickeberg e Emil Heinrich Snethlage. Outros nomes que aparecem nas fontes são menos importantes para entendê-la. Quem foi Nimuendajú é algo que geralmente não precisa ser explicado aos leitores brasileiros e outros igualmente familiarizados com a vida e obra desta personagem quase lendária da história da antropologia. Curt Unckel nasceu em 17 de abril de 1883 em Jena, Turíngia, emigrou para o Brasil em 1903, viveu entre os Guarani numa aldeia do rio Batalha, no estado de São Paulo, entre 1905 e 1907, onde recebeu o nome Nimuendajú, o qual registrou como sobrenome em 1926 ao optar pela nacionalidade brasileira, e morreu em 10 de dezembro de 1945 numa aldeia Ticuna, no município de São Paulo de Olivença, região do Alto Solimões, por causa ainda não apurada de forma conclusiva. Mais de quatro décadas dedicadas à etnologia indígena, com pelo menos 34 pesquisas de campo entre mais de 50 etnias indígenas e um grande número de publicações, em parte lançadas apenas postumamente, sobre temas de etnologia, linguística e arqueologia indígena, além de volumosa correspondência com os mais diversos especialistas em temas indígenas de vários países, renderam a Nimuendajú, ainda em vida, o reconhecimento como uma das maiores autoridades da etnologia dos povos indígenas no Brasil na primeira metade do século XX e, segundo alguns autores, como sendo a maior durante todo esse período (para um levantamento bibliográfico sobre vida e obra de Nimuendajú cf. Schröder, 2013).
O americanista Krickeberg, no entanto, é um antropólogo pouco conhecido no Brasil. Tendo vínculos profissionais com o Museu Etnológico de Berlin desde 1906, costumava ser considerado um “homem do museu” (Museumsmann), inclusive tendo sido seu diretor de 1939 a 1954, ano de sua aposentadoria. Ao contrário de vários de seus colegas do departamento americanista, como Konrad Theodor Preuss (1869-1938) ou Max Schmidt, Krickeberg não ficou conhecido como pesquisador de campo, mas principalmente como sintetizador de saberes sobre as antigas culturas das Américas. Em seus escritos, revelando amplos conhecimentos e interpretações de teor difusionista, é possível perceber uma preferência pelas teorias de Alfred Kroeber e Robert Lowie, em detrimento da Escola (vienense) de Círculos Culturais (Kulturkreislehre) [5]. Um capítulo bastante sombrio de sua biografia foi a lealdade ao regime nazista e o abuso de poder contra colegas, por exemplo, através de discussões em revistas da sua área científica, com acusações contra antropólogos “não-arianos” (ver Alvarado, 2006). No entanto, depois da guerra Krickeberg foi absolvido por um tribunal militar americano e reempossado em sua função de diretor do museu. É interessante observar que nas fontes primárias consultadas para esta pesquisa não consta uma única referência direta e inequívoca ao regime nazista.
Snethlage, sobrinho da ornitóloga Emilie Snethlage (1868-1929), ficou mais conhecido no Brasil por sua expedição ao Alto Madeira e Guaporé (1933-1935) e pelas publicações resultantes (ver o artigo biográfico de seu filho, Rotger Snethlage, 2002). No período do início da correspondência com Nimuendajú até seu falecimento prematuro num acidente em 25 de novembro de 1939, Snethlage teve vínculo profissional com o Museu Etnológico de Berlim.
As fontes primárias desta pesquisa são:
1) Correspondência de Nimuendajú com Krickeberg, Snethlage e Carlos Estevão de Oliveira, de 1934 a 1939, somando 34 cartas localizadas até agora. Enquanto as cartas para Carlos Estevão de Oliveira já foram publicadas, a correspondência com Krickeberg e Snethlage encontra-se arquivada no Museu Etnológico de Berlim (seis cartas) e no Arquivo Curt Nimuendajú no Museu Nacional/UFRJ (21 cartas). Estas últimas, no entanto, foram destruídas pelo incêndio no Museu Nacional em 2 de setembro de 2018. A correspondência foi redigida exclusivamente em alemão, sendo a maioria datilografada, ou seja, de leitura fácil, mas também há uma parte manuscrita e em estado precário, exigindo conhecimentos muito avançados de leitura e familiaridade com letras manuscritas em alemão.
2) A lista original de objetos, em alemão, elaborada por Nimuendajú (1935, oito folhas), com comentários do autor, arquivada em Berlim.
3) O registro dos objetos nos livros de entrada (Objektverzeichnis V B 11111-11338) do museu.
4) 38 fotos dos Ramkokamekrã, em parte já publicadas, também em Berlim.
5) E, last but not least, os próprios objetos, nos armários do depósito do museu em Berlim.
Com base nestas fontes foi possível reconstruir a história da coleção.
O contato inicial
Em 1934 Nimuendajú realizou, com auxílio financeiro da Carnegie Institution, sua famosa viagem à Europa, aliás única e última depois de ter emigrado para o Brasil. Ele aproveitou a oportunidade para visitar diversos museus etnológicos na Alemanha. Em 10 de maio de 1934, escreveu estas palavras a Carlos Estevão:
De 28 de abril a 4 de maio estive em Berlim. O museu etnográfico é um colosso, o material é imenso. No Prof. W. Krickeberg, seu diretor, não notei aquele abatimento moral que tanto me impressionou em outras partes. Parece mesmo que este museu ainda dispõe de alguns recursos (Snethlage!), pois Krickeberg tratou logo de entabolar negociações comigo para o futuro, falando de coleções que queria comprar, de trabalho e publicações e mesmo de subsídios. À vista do que foi combinado com o Snr., desviei-me de qualquer compromisso. Notei que tanto Krickeberg como também o Prof. Preuss se manifestaram com bastante aspereza sobre Snethlage, censurando francamente a sua leviandade e falta de responsabilidade que, segundo dizem, se manifesta em todos seus trabalhos, deixando transparecer que Snethlage teria conseguido a sua posição no museu mais pela sua habilidade em saber agradar as vaidades do ex-diretor W. Lehmann do que à sua habilidade científica.
O material dos Jês setentrionais consiste de uma boa coleção dos Kayapó, de Kissenberth, uma dúzia de peças dos extintos Canelas da Travessia, do mesmo, e de umas três ou quatro dúzias de objetos dos Timbira do Rio Grajaú e dos Canelas do Ponto trazidos por Snethlage. (Nimuendajú, 2000: 208)
As referências a Snethlage dizem respeito, no primeiro parágrafo, à expedição que o mesmo estava realizando nesse ano de 1934 e, no final da citação, a uma viagem entre 1923 e 1926, em parte em companhia de sua tia Emilie Snethlage. Não fica claro se o “abatimento moral” citado é uma alusão sutil ao nazismo ou apenas ao estado geral dos museus etnológicos na Alemanha em consequência dos impactos da Primeira Guerra Mundial na vida científica da Alemanha, certamente ainda perceptíveis na época.
Em 9 de junho, já estando em Gotemburgo, Nimuendajú escreve noutra carta a Carlos Estevão: “Às vezes penso que lá em Berlim eu podia aproveitar mais, porém não me arrisco a voltar para lá. Krickeberg e Lehmann-Nitsche [6], que agora também lá se acha, estão me escrevendo constantemente” (Nimuendajú, 2000: 214). Não é claro qual seria o risco de voltar para Berlim. A correspondência contínua à qual Nimuendajú se refere são, na realidade, três cartas pequenas de Krickeberg, nas quais este agradece diversas informações etnográficas e uma série de fotografias emprestadas. [7] Contudo, elas revelam o grande apreço do antropólogo museal pelo experiente pesquisador de campo.
E esta alta estima torna-se ainda mais evidente numa carta de Krickeberg de 3 de outubro do mesmo ano, depois de Nimuendajú ter voltado a Belém: “O trabalho do senhor é imensamente interessante e importante, de tal maneira que sinto muito não vê-lo impresso numa revista científica alemã”, sugerindo, inclusive, o Baessler-Archiv (Berlim) para tal publicação. [8] Krickeberg ficou bastante impressionado com um manuscrito sobre “a corrida de toras dos Timbira”, escrito em 1934, ao que parece durante a estada em Gotemburgo, e elaborado como um capítulo da primeira versão do manuscrito sobre os Timbira, depois enviado para Robert Lowie em 1935 (para uma tradução ver Nimuendajú, 2001). A carta indica também que pesquisas sobre os povos indígenas de línguas Gê tinham começado, na época, a despertar interesse científico nas mais diversas partes da pequena comunidade de antropólogos.
O acordo
Antes de visitar os referidos museus e de conhecer, em particular, Krickeberg, Nimuendajú já tinha estabelecido contatos regulares, ao longo de duas décadas, com instituições alemãs de pesquisa etnológica (institutos, museus, periódicos). Estes contatos, sobretudo epistolares, foram iniciados depois da mudança de São Paulo para Belém, em 1913. Inicialmente intermediados por Emilie Snethlage e Theodor Koch-Grünberg, só terminaram definitivamente com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, não podendo ser retomados depois da mesma (o falecimento de Nimuendajú ocorre em dezembro de 1945).
Antes de organizar uma coleção para o Museu Etnológico de Berlim, Nimuendajú já tinha realizado duas expedições para a coleta de objetos etnográficos, bem como pesquisas etnológicas para instituições sediadas na Alemanha. A primeira, de setembro de 1928 a maio de 1929, que o levou aos Apinayé, Krĩkateyé, Kreapimkateyé, Pukobyê, Guajajara e Canela (Apanyekrã e Ramkokamekrã), foi financiada pelos museus etnológicos de Leipzig, Dresden e Hamburgo. Na segunda, de fevereiro a setembro de 1930, visitou os Apinayé, Xerente, Krahô e Ramkokamekrã. Foi financiada pelos museus etnológicos de Leipzig e Hamburgo, pelo Instituto de Etnologia da Universidade de Leipzig e com recursos da Notgemeinschaft der Deutschen Wissenschaft (NDW). [9] Segundo as listas de objetos originais arquivadas nos respectivos museus etnológicos, o museu de Leipzig adquiriu 51 objetos dos Ramkokamekrã, o de Dresden 190 e o de Hamburgo um total de 346. Ou seja, com suas atividades colecionistas para Berlim, Nimuendajú não pisou em nenhuma terra incógnita. Pelo contrário, voltou para um terreno preparado em anos anteriores.
Informações sobre o que foi acordado encontram-se em duas cartas arquivadas em Berlim e, anteriormente, no Rio. Numa carta datada de 3 de outubro de 1934, Krickeberg comenta:
Já que agora temos algum dinheiro para aquisições, aguardo com prazer eventuais coleções ou peças individuais que o senhor me possa oferecer. Como sabe, agradar-me-ia muito um bom machado semilunar [10] e também outros objetos cerimoniais, por exemplo, uma das pequenas “torinhas de corrida das almas dos mortos” [11] dos Canela que o senhor menciona em seu artigo. No entanto, não ficou claro como será resolvido o pagamento, em virtude de nossa atual escassez de divisas. [12]
Trata-se então de uma oferta inequívoca no sentido de ‘obter objetos’ para o museu numa modalidade de colecionismo bastante usual na época e com a qual Nimuendajú estava bem familiarizado (ver Castro Faria, 1987). No fundo, e apesar da precariedade material de suas condições de vida (repetidas vezes relatadas em suas cartas), ele estava inserido numa rede de contatos com museus europeus e brasileiros que eram clientes num mercado internacional de ethnographica. Em suma, Nimuendajú era considerado um fornecedor fiável.
Uma anotação manual na mesma carta de 3 de outubro de 1934 indica que ele respondeu à de Krickeberg em 5 de novembro, mas parece que esta resposta se perdeu [13], de modo que conhecemos pouquíssimos detalhes da negociação com o museu. Em 22 de janeiro de 1935, no entanto, Nimuendajú escreve a seu amigo Carlos Estevão de Oliveira sobre a visita de Snethlage a Belém:
Vendo a minha absoluta falta de recursos e a impossibilidade daí resultante de fornecer ao Museu de Berlim a coleção dos Canelas que este desejava adquirir, [Snethlage] pediu e obteve ordem para me entregar, do dinheiro que lhe sobrava, a soma de 100£. Está, portanto, garantida a minha ida aos Canelas em fins de março ou começo de abril. (Nimuendajú, 2000: 222)
Em carta datada de 23 de janeiro de 1935, dirigida a Krickeberg, este valor é confirmado:
Por ordem de V. Exa., o Sr. Dr. Snethlage passou-me, dois cheques no dia 5 de janeiro no valor total de 100 £, sobre os quais lhe emiti recibo, sendo o montante destinado a compor uma coleção dos Canelas. [14]
E Nimuendajú continua:
Eu já tinha relatado a V. Exa. como minha tentativa de organizar coleções entre os índios de Pernambuco foi um fracasso contundente e que, por causa disso, me faltaram os meios para visitar outra vez os Canelas em final de março ou início de abril e lá organizar coleções para os museus de Berlim e do Rio. Graças a sua gentil boa vontade e do Dr. Snethlage, esta viagem agora está garantida.
No final da carta, ele explica:
Assim, penso partir do Pará em início de abril o mais tardar, como já disse. Os meses de maio, junho e julho passarei entre os Canelas, e penso chegar em agosto a São Luís, de onde mandarei remeter ao senhor a coleção, a qual deverá chegar a suas mãos em setembro. Receberá com toda a certeza as torinhas de corrida das almas dos mortos, já que tais corridas acontecem por ocasião da solenidade do Ketuayé, a qual celebraremos. Se ainda tiver pedidos especiais com relação à coleção, faça-me, por favor, a gentileza de comunicá-los a tempo.
Espero, com a venda das duas coleções dos Canelas, obter os meios para visitar outra vez em início de 1936, e por alguns meses, os Akwẽ-Šerénte.
Este trecho permite perceber como Nimuendajú planejou suas expedições futuras com base nos ‘sucessos’ das anteriores. Nestes casos, ‘sucesso’ significava informações etnográficas que podiam ser transformadas em publicações e coleções que podiam ser vendidas a museus.
O campo
As atividades entre os Canela e as peripécias e vicissitudes das viagens e da experiência de campo são relatadas principalmente em quatro cartas. [15] Nimuendajú inicia a primeira, de 25 de junho de 1935, enviada de Barra do Corda, no interior maranhense, com a informação de que teria saído de Belém a 31 de março, mas teria chegado à aldeia dos Ramkokamekrã apenas a 9 de maio devido a enormes dificuldades de transporte. No entanto, ao chegar à aldeia, encontrou os indígenas numa situação bastante preocupante:
Encontrei os índios em condições inopinadamente desfavoráveis: em abril, uma epidemia de sarampo tinha custado as vidas de umas 20 crianças. Três dias antes da minha chegada, tinham surgido bexigas na aldeia e, ao mesmo tempo, a gripe. Voltei a Barra do Corda e consegui que um enfermeiro do posto de saúde local fosse enviado à aldeia, onde vacinou toda a população. Infelizmente o material era tão ruim que somente uns 10% das vacinas acusaram resultados positivos. Por causa disso, logo surgiram novos casos de bexigas. No entanto, consegui afastar da aldeia as famílias contagiadas e isolá-las em seus roçados, e quase parece que a epidemia se extinguiu. Por outro lado, um número elevado de índios ainda morreu de gripe e suas consequências (bronquite e pneumonia), e muitos decaíram fisicamente, de modo que ainda se podem esperar mais óbitos. Entre a população neobrasileira a varíola e a gripe também continuam a grassar. [16]
Este trecho indica que Nimuendajú não era simplesmente um “sertanejo mercenário”, como Luís de Castro Faria declarou numa entrevista concedida a Elena Welper (2002: 111). Estamos perante uma mistura entre pragmatismo indigenista, caridade humanitária e interesses abertamente colecionistas, o que fica mais evidente no seguinte trecho, onde ele tenta justificar os resultados obtidos:
É natural que meu trabalho tenha sofrido bastante nessas condições desfavoráveis. Do ponto de vista moral, é simplesmente uma tortura para ambas as partes ter que pechinchar e discutir preços onde a gente é recebida como curador e salvador da miséria. Ainda assim, lucrei com umas 700 peças, depois não havia mais nada, e meu dinheiro também tinha acabado. Deste material, contudo, tenho que entregar 500 peças ao Museu Nacional (eu tinha prometido 600-700), pois se não cumpro razoavelmente meu acordo com o mesmo, posso estar seguro que eles irão providenciar que não possa de futuro continuar a trabalhar. No entanto, os 200 objetos que posso remeter ao museu berlinense nas condições prevalecentes não proporcionam, para minha vergonha, uma imagem completa da cultura timbira – para isso seria necessário ter o dobro – nem cobrem a quantia adiantada de 100 £. Os museus do Pará e de Gotemburgo, que também querem adquirir material dos Ramkokamekrã, ficarão sem nada. Na coleção destinada a Berlim encontram-se três máscaras de dança, as torinhas de corrida das almas dos mortos e muitas outras coisas que certamente o interessarão. [17]
Como em outras expedições contratadas, Nimuendajú minimiza os resultados, transformando-os em ‘fracassos’ ou, ao menos, em ‘meio-sucessos’, antes mesmo de receber qualquer reação do destinatário. Isto pode ter sido uma estratégia preventiva, já que conhecia as elevadas expectativas dos museus – onde muitas vezes os antropólogos de gabinete não dispunham de conhecimentos adequados para saber avaliar as dificuldades encontradas em campo. [18] Ao mesmo tempo, ele aproveita a minimização dos resultados para inserir uma proposta sutil no sentido de dar continuidade ao trabalho, colocando o ônus no destinatário:
Não sei bem o que fazer agora: depois de remeter a coleção de 200 objetos, ainda estarei devendo a seu museu cerca de 40 £. O que eu mais gostaria seria voltar [ao campo] outra vez no ano que vem e compensar o que está faltando, contanto que, claro, os Ramkokamekrã consigam superar a crise atual e recuperar razoavelmente o antigo ritmo de sua vida econômica e social. Mas de onde receber os recursos, não sei. [19]
Em duas cartas a Carlos Estevão de Oliveira, as preocupações financeiras e logísticas referentes à coleção são expressas de forma sucinta: “Tirei para o Museu de Berlim 225 peças, ficando assim ainda devendo a este instituto uns 2.500$000 da soma que me adiantaram.” (2 de julho de 1935; Nimuendajú, 2000: 231) E em 21 de julho: “Preciso levar para Belém a coleção que se destina a Berlim, porque não tenho meios para esperar aqui por um vapor conveniente.” (idem: 239) Ou seja, há referências sobre as condições extraordinariamente difíceis em que se encontrava para organizar a coleção, mas não sobre os procedimentos exatos que pretendia seguir, o que talvez não interessasse tanto a Krickeberg.
Tendo voltado a Barra do Corda, Nimuendajú reduz um pouco a minimização dos resultados alcançados, numa carta para Krickeberg datada de 30 de julho de 1935:
Envio-lhe anexado o catálogo da coleção dos Canela. Ainda lhe enviarei a partir do Pará algumas fotos referidas no mesmo, depois de revelar e copiar os filmes.
A coleção chegou às 225 peças e assim ao menos rende uma imagem razoável da cultura Canela, mas mesmo assim muita coisa ainda está faltando e devia lá estar em qualquer caso, como por exemplo os apanhadores [20] e os adornos plumários dorsais [21], e não há noção adequada da riqueza de variedades. Isto me chateia, mas não foi possível fazer de outra maneira. [22]
Depois das desculpas sobre os resultados da expedição, Nimuendajú continua a carta com um relato mais aventureiro:
Acredito nunca ter trabalhado, como agora, em condições tão desagradáveis e, exceto entre os Parintintin [23], francamente perigosas. Os inimigos dos índios achavam que, com suas difamações e ameaças, já me teriam impedido de voltar aos Canelas, e ficaram com raiva quando reapareci de repente na aldeia. Em 28 de junho fui agredido em Barra do Corda em plena luz do dia; depois cinco testemunhas “provaram” que EU teria sido o agressor! – Desde então não passou nenhum dia em que não me fosse transmitido furtivamente que seria assassinado ou que no mínimo levaria uma porrada. Isso durou até vir de São Luís, acompanhado de 12 homens, um tenente da polícia que pouco tempo depois recebeu por telegrama a ordem do chefe da polícia de São Luís para me dar toda a proteção possível e a garantia de que eu poderia finalizar meu trabalho. Ontem houve um pequeno e engraçado tiroteio entre os soldados da polícia e os “senhores” de Barra do Corda. Terminou com a prisão de uns 20 arruaceiros e fanfarrões. ... e paz na terra às pessoas que recebem a Sua graça! [Lucas, 2, 14] – Ainda tenho mais segurança entre os índios. [24]
Não foi a primeira vez que Nimuendajú entrou em atritos com a população regional não-indígena, como se pode ver numa carta a Carlos Estevão de 1 de abril de 1929:
[...] eu dei conta dos vendedores de cachaça: com a minha costumeira sem-cerimônia e como se tivesse para tal toda a autorização, expulsei três deles da aldeia [do Ponto], e foi remédio santo; toda a cristandade em roda ficou desconfiada e com medo e nunca mais me apareceram na aldeia com cachaça. (Nimuendajú, 2000: 142)
Este trecho é apenas um dos exemplos – e vários outros podem ser encontrados na correspondência com Carlos Estevão sobre a aldeia do Ponto –, onde Nimuendajú relata suas intervenções contra os vendedores de álcool. “Como se tivesse para isto toda a autorização”, escreve, o que torna o assunto muito explícito. Não sendo funcionário do Serviço de Proteção aos Índios (SPI), ele de fato não tinha autorização oficial para expulsar os vendedores, mas atuou da forma referida por achar que assim poderia salvar os indígenas das piores influências da “civilização”, ou seja, um intervencionismo no estilo indigenista motivado por valores salvacionistas relativos às culturas indígenas.
A carta de 30 de julho de 1935 termina com informações sobre a situação na aldeia e sobre as possibilidades de embarcar a coleção:
Infelizmente as bexigas ainda não se extinguiram, como eu esperava, e enquanto estava catalogando e embalando as coleções em Barra do Corda, surgiram novos casos que não foram isolados devido à minha ausência. Quando depois voltei, metade da aldeia já estava contaminada, mas estranhamente não morreu mais ninguém.
A fotografia anexada dá uma ideia de como o adorno plumário dorsal (hąkyará) é usado. Faz lembrar bastante os correspondentes adornos plumários dos índios das pradarias e de seus vizinhos e o Momoyactli dos antigos astecas. O dono [do objeto] queria uma espingarda, enquanto eu nem tinha mais o dinheiro da passagem de Barra do Corda a São Luís! (Depois ainda consegui emprestado o necessário) [25]
É possível que a pessoa que adiantou esse montante fosse Carlos Estevão. O trecho, aliás, é o único na correspondência com referência direta à negociação de um objeto com um indígena. A carta termina desta forma:
Agora estou aqui [Barra do Corda] esperando por uma oportunidade de passagem para São Luís, a qual, no entanto, provavelmente apenas haverá na semana que vem. Ainda assim, espero chegar a São Luís em torno do dia 12 de agosto, e logo iniciarei o embarque das coleções, isto é, depois de ter recebido a autorização do Conselho de Fiscalização [26] no Rio, o que espero que não leve tempo demais.
A primeira resposta de Berlim foi bastante positiva, mesmo antes da chegada da coleção. Krickeberg até tentou acalmar as preocupações de Nimuendajú:
Com muito pesar li o relato dos percalços que o perseguiram entre os Ramkokamekrã. Mas parece que na América do Sul é sempre necessário contar com tais condições desfavoráveis. O Dr. Snethlage também é capaz de relatar casos de rendimentos inesperadamente diminutos entre tribos que pouco tempo antes ainda eram uma mina. Se o senhor desta vez ainda não conseguiu juntar uma coleção totalmente satisfatória para nós, então não quero pressioná-lo preencher as lacunas imediatamente. Tenho a certeza que o senhor terá outras oportunidades para fazê-lo, se não entre os Ramkokamekrã, então entre uma tribo Gê aparentada. Entretanto, aguardo com muito interesse a remessa dos 200 objetos, dos quais espero que cumpram tudo aquilo que a interessante máscara representada na foto já está prometendo. [27]
Nesta carta, Krickeberg é muito explícito com relação a seus interesses museológicos: o que importa são os objetos e sua qualidade ou, em suas palavras, o “rendimento” (Ausbeute). Uma sociedade indígena, neste tipo de raciocínio, podia ser considerada uma ‘mina’ (Fundgrube). Só faltou chamá-la de garimpo ou baú. Ao mesmo tempo, seu pensamento permanece implícito quanto à possibilidade de representar uma cultura em sua totalidade através de uma criteriosa seleção de objetos. Para este tipo de representação não podia haver ‘lacunas’ (Lücken), um pensamento, aliás, compartilhado pelo próprio Nimuendajú, como mostrou a carta de 25 de junho de 1935. Mas a carta seguinte, de 31 de agosto, também é reveladora neste sentido:
Acabei de embarcar aqui em condições apropriadas a pequena coleção Canela (225 peças em três volumes) destinada a seu museu. A “Askania”, do Norddeutscher Lloyd, que partirá hoje à noite ou amanhã cedo de São Luís, a levará. Esse vapor irá daqui ao Pará, depois às ilhas da foz do Amazonas, onde carregará madeira por uma a duas semanas, depois voltará ao Pará e só então partirá para a travessia. Assim, poderá ser em meados de outubro que chegará a Hamburgo. [...] Todos os objetos de palha de buriti que foram deformados pela embalagem podem ser ajeitados quando borrifados com água ou, melhor ainda, quando expostos ao orvalho por uma noite (isto é que os índios fazem). As grandes máscaras Kokrįt-hó precisam ser remontadas de acordo com o modelo menor (n. 225).
[...]
O material enviado infelizmente não proporciona nenhuma imagem completa da cultura Canela nem cobre a quantia de 100 £ adiantada pelo museu. Pessoalmente, tenho o maior interesse em visitar outra vez os Canelas, não só para completar a coleção berlinense, mas também para conseguir o material solicitado pelos museus do Pará e de Gotemburgo, além do fato de que ainda precisaria, em todos os casos, de verificar diversos assuntos em matérias sociais e religiosas e de anotar textos. Contudo, regressei ao Pará completamente sem recursos e por enquanto não tenho a mínima ideia de onde tirar o dinheiro para fazer uma nova visita à tribo. Por isso peço ao senhor de me perdoar que não posso cumprir meus deveres para com seu museu. Para mim é desagradável demais que isso tenha acontecido logo na primeira encomenda que recebi de sua parte, mas realmente as condições estavam extraordinariamente desfavoráveis desta vez. [28]
Ou seja, o tom da carta voltou a ser justificador, expressando uma insatisfação com o alcançado.
A coleção em Berlim
A lista original de objetos, datilografada por Nimuendajú e datada de 30 de julho de 1935, contém 225 itens. Além dos nomes em alemão, muitas vezes são dadas as denominações indígenas, grafadas com sinais diacríticos explicados no início da lista. Por exemplo, o objeto n.º 23: “Estilingue (hũ-kapér-čą) para afugentar papagaios-anão dos roçados”.
Além disso, um aspecto muito valioso da lista, aliás bastante apreciado por todos os museus para os quais Nimuendajú organizou coleções, consiste em suas explicações de diversos objetos. Por exemplo, o objeto n.º 27: “Flecha de arremesso [29] de cana uvá [sic] com bola de palha de milho fixada. Tais flechas são lançadas quando é realizada a cerimônia da abertura da colheita do milho na praça central da aldeia, sendo que os jogadores demonstram suas habilidades ao esquivar-se”. Além disso, há pequenos desenhos inseridos, geralmente para mostrar a forma do corte transversal de arcos ou bordunas.
De alguns tipos de objetos, a coleção abrange vários exemplares, por exemplo: sete tipos de arcos, quinze flechas, doze bordunas, dezesseis testeiras, quatro colares, três cintos, quatro bodoques de orelha, quatro abanadores de palha, onze brinquedos, cinco apitos, três flautas, sete tipos de vasos, uns vinte tipos de cestinhos e quatro máscaras. Uma parte dos objetos chama a atenção por características peculiares:
Uma lança cerimonial (krowa-čwá), “é concedida a homens que possuem cantos próprios” (objeto nº 26);
“Bastões (hakró-re) usados pelos corredores na corrida de revezamento” (nº 28);
“Cordão umbilical (hõ-tot) de uma criança. Quando esta tem cerca de cinco anos de idade, é colocado, por ordem da mãe, no buraco de uma sucupira para que a criança fique forte e resistente” (nº 116);
Kupá (nº 162), com anotação manual: “entregue ao Jardim Botânico para análise, Snethlage” (Nimuendajú ficou bastante fascinado por esta planta cultivada, como se verá);
Os objetos mais chamativos da coleção: três máscaras Kokrit.
Em outras palavras, trata-se de uma coleção bastante diferenciada, composta por objetos relacionados com os mais diversos aspectos da vida econômica, social e religiosa dos Ramkokamekrã. Não foi encontrada até agora nenhuma carta de Krickeberg em que o recebimento da coleção seja acusado oficialmente e através da qual seria possível conhecer diretamente sua reação. No entanto, uma carta de Snethlage, datada de 4 de novembro de 1935, permite tirar conclusões sobre a impressão causada pela coleção em Berlim:
Antes de mais nada! Estamos muito satisfeitos com sua coleção. Quando a comparamos com outras, conseguimo-la ainda por um preço módico. Mas somos homens do museu e temos que agir no interesse do museu. Então, não diremos não se o senhor quiser nos mandar mais. Se não existissem as restrições de divisas para a Alemanha, o Prof. Krickeberg lhe mandaria mais dinheiro, junto com uma lista do que temos, mais ou menos, e anotaria: Colete para nós o que e onde quiser.
[...]
Ora, o senhor bem vê pelo sobredito reparo que o Prof. Krickeberg gostaria muito de contratá-lo. A maneira cuidadosa de coletar, que o distingue de todos os outros, agrada-lhe muito e ainda mais suas observações sociológicas e religiosas. Só precisa levar em consideração que ele, como diretor do museu, atua em primeiro lugar a favor do museu. Por besteira combinei com o senhor um número aproximativo que, em minha avaliação atual, é alto demais. K. não faz questão dele, mas não quer dispensar os seus serviços, por interesse do museu [anotação manuscrita de Snethlage: “(sobretudo, para não rejeitar, perante os seus superiores, ofertas que nos enriquecem) confidencial!”] Mas isto posso dizer ao senhor com toda a tranquilidade: não se imponha sacrifícios. Ficaremos satisfeitos com cada objeto que nos envie, embora já estejamos contentes com o que temos [30].
A carta contém grandes elogios, muito explícitos, mas ao mesmo tempo deixa ao destinatário uma ambiguidade por resolver: afinal, todos estavam satisfeitos com os resultados; mas ainda haveria cobranças por mais objetos no âmbito da proposta inicial? Infelizmente, até agora não foi localizada em nenhum arquivo a resposta de Nimuendajú, de 18 de novembro de 1935, a qual pode ser deduzida a partir de uma anotação a lápis vermelho (“R.18.XI.35”).
Em 14 de outubro de 1935, ele também tinha enviado 41 fotos “da festa das máscaras, da corrida de toras e de outros assuntos da aldeia dos Ramkokamekrã”. [31] Desse conjunto de fotos, 38 já foram localizadas em Berlim. Na mesma carta, Nimuendajú acrescenta algumas observações interessantes:
Aliás, realmente parece que esse tenaz povo Gê dos Ramkokamekrã saiu ileso da terrível crise em que se encontra. Em tais condições, uma tribo Tupi já teria ido para o diabo.
Já posso prometer-lhe com certeza quase absoluta que realizarei outra estada entre os Ramkokamekrã em abril de 1936 para poder cumprir meus compromissos junto aos museus de Berlim, do Pará e de Gotemburgo e para finalmente concluir meus estudos. Se eu então lhe enviar outros 250 números, ficará com uma coleção aproximadamente completa. Para o Pará estão faltando outros tantos, para Gotemburgo apenas 30. A questão financeira da viagem está praticamente resolvida.
Atualmente estou trabalhando para o Prof. Robert Lowie, a quem forneço material sociológico. Provavelmente este trabalho me renderá tanto que poderei realizar no ano que vem a viagem planejada e também concluir finalmente meu manuscrito [sobre os Timbira].
É interessante observar que Nimuendajú ainda se considera devedor do museu e se sente na obrigação de explicar como pretende ‘saldar a dívida’ por meio dos rendimentos de outro trabalho. Ao mesmo tempo, a carta revela o início de uma nova modalidade de cooperação na sua biografia acadêmica, nomeadamente com instituições norte-americanas.
Na correspondência posterior encontrada até agora, composta quase exclusivamente por cartas entre Nimuendajú e Snethlage, não há mais referências à coleção dos Ramkokamekrã, por exemplo, se ela foi exposta no museu ou se foi publicado algum catálogo. A correspondência transmite a impressão implícita de que a coleção serviu, naquele momento, apenas para ‘fechar as lacunas’ dos conjuntos de objetos que representariam as diversas áreas, ou províncias, daquela parte do mundo. Nas cartas há relatos resumidos de Nimuendajú sobre outras expedições realizadas e informações recíprocas sobre projetos de publicações, trabalhos publicados e questões relativas a detalhes etnográficos, mas até agora não foi encontrada qualquer outra missiva sobre a coleção depositada em Berlim.
Teorias
Organizar coleções para museus não acontece num vácuo teórico e metodológico. Da mesma forma que, no caso de etnografias, não existem descrições puras, porque toda e qualquer descrição se baseia em alguma opção teórica, ao menos implícita (Bruck 1987), a própria composição de coleções e a escolha de seus objetos implicam decisões baseadas em teorias, explícitas e implícitas (Clifford 1988). E a história da coleção do Museu Etnológico de Berlim apenas reforça esta constatação. No caso de Nimuendajú, precisa ser levada em consideração sua proximidade com a etnologia alemã da época, ou seja, suas leituras e trocas de correspondência, apesar de nunca se ter declarado seguidor de alguma vertente teórica.
Os objetivos da pesquisa etnológica de Nimuendajú encaixam-se nas preocupações de uma antropologia americanista em sentido abrangente, com pontos em comum com o projeto boasiano, e de uma etnografia de salvação: resgatar as manifestações indígenas, especialmente aquelas ameaçadas de desaparecimento, anotar textos, coletar objetos e registrar imagens, antes que seja tarde demais. E essas preocupações estão alimentadas, por sua vez, por um pessimismo cultural profundo referente aos efeitos destrutivos da chamada ‘civilização’, a qual, nas palavras de Nimuendajú, muitas vezes é equiparada à “cristandade”.
Outro indicador de visões teóricas são os comentários breves na correspondência com Krickeberg sobre o caráter incompleto da coleção devido à necessidade de ela ter que apresentar uma imagem ‘completa’ da cultura indígena por meio da cultura materializada.
Um interesse peculiar por história cultural de cunho difusionista manifesta-se num detalhe da correspondência, nomeadamente em passagens relativas a uma planta cultivada chamada kupá (nº 162 da coleção). Esta planta é mencionada logo na primeira carta enviada de Barra do Corda, em 25 de junho de 1935:
(...) eu sempre terei de confessar o quanto ainda me falta aprender. Assim, na minha visita atual constatei que a planta cultural chamada “kupá” pelos Timbira não é de todo uma das muitas variedades de Dioscorea [32] plantadas por estes índios, mas uma planta totalmente desconhecida por mim, da qual não se consome o tubérculo, como eu pressupunha, mas sim o caule (igual ao espargo). Em tempos antigos, ela foi plantada em grande escala, hoje em dia encontram-se apenas poucos espécimes como curiosidades.
A kupá não existe em estado selvagem. Ela é exclusivamente uma planta cultural dos Timbira (e de seus parentes culturais). Nem os neobrasileiros, nem os Tupi, tampouco os Arawak e os Karib a conhecem. Da literatura, apenas me lembro de uma menção em Francisco de Paula Ribeiro (1815), relativa aos mesmos Timbira que atualmente ainda a usam. Tanto quanto sei, Martius não a conhecia, e também é bem possível que até hoje não tenha sido devidamente identificada pelos botânicos. Na coleção destinada a Berlim encontram-se alguns tanchões, os quais, por terem uma vida muito resistente, talvez cheguem lá com capacidade de reprodução. Eu mesmo tentarei cultivá-la no Pará para poder mandar classificá-la, pois não consegui obter suas flores devido à estação avançada.
Mas se a kupá de fato é propriedade singular das tribos primordiais do Nordeste seco do Brasil, então isso constitui uma prova de que a agricultura dessas tribos não foi de maneira alguma tomada de empréstimo aos Tupi ou a seus parentes culturais, mas que ela possui elementos primordiais muito antigos. [33]
Os trechos reproduzidos da carta revelam como a curiosidade despertada pela planta tem pouco a ver com interesses etnobotânicos, mas muito mais com interpretações histórico-culturais sobre a antiguidade da agricultura entre os Gê com relação aos Tupi como difusores culturais. O entusiasmo de Nimuendajú explica-se pela possibilidade vislumbrada de reescrever em parte a história cultural dos indígenas naquela parte do Brasil.
A resposta de Krickeberg com relação à kupá, na carta de 20 de agosto de 1935, é bastante lacônica: “Sua constatação sobre a kupá para a avaliação da cultura Gê é sem dúvida de muita importância”. [34] No entanto, Nimuendajú não desiste do assunto e escreve na carta de 31 de agosto de 1935:
Eu gostaria de solicitar novamente a V. Exa. que se dedicasse à classificação da planta cultural kupá, da qual se encontram na coleção alguns feixes de tanchões (n.º 162). A planta precisa de solo arenoso e clima seco; aqui ela é plantada em setembro, no início da estação chuvosa. Como trepadeira, a kupá precisa de uma estaca para poder subir; os Timbira plantam-na ao pé de uma árvore morta.
Os pedaços são enfiados na terra de esguelha até metade de seu comprimento. Os tanchões são muito resistentes. Provavelmente a kupá ainda não foi classificada botanicamente. Também precisaria ser verificado se na lista de plantas alimentares dos (Otschukayana-)Tapuya em Piso & Marcgrav – Historia Naturalis Brasiliae não se encontra uma descrição que corresponda à kupá; não tenho a obra à mão. [35]
E na carta de 14 de outubro de 1935, também destinada a Krickeberg:
A kupá que plantei aqui em meu quintal cresce razoavelmente bem e espero fazê-la florescer. Mas ainda assim seria bom o senhor também tentar aí o plantio numa estufa. [36]
Depois o assunto desapareceu da correspondência com Krickeberg, que talvez não tenha partilhado o interesse de Nimuendajú pela planta. Apenas numa carta para Snethlage, de 14 de setembro de 1936, Nimuendajú escreve pela última vez a um de seus interlocutores berlinenses sobre a kupá:
As kupá desenvolveram-se maravilhosamente tanto na cerca de meu quintal quanto no Jardim Botânico, mas ainda não produziram flores; estas talvez venham no próximo ano. Provavelmente trata-se de uma espécie desconhecida de Vitis. [37] Na “Flora Brasiliensis”, o senhor encontrará reproduzidas várias espécies de parentesco muito aparentadas. Uma, com espinhos, a chamada “cipó arraia” é bastante comum na região dos lagos e dos campos inundados das terras baixas do Maranhão, uma verdadeira praga. Em minha última visita comi pela primeira vez kupá preparada: ela tem gosto bastante agradável, mais ou menos como macaxeira, e também um pouco como castanhas [portuguesas] cozidas. [38]
Quaisquer que tenham sido as reações suscitadas pela insistência de Nimuendajú, seu interesse pela planta foi mais bem acolhido por Robert Lowie, que traduziu um pequeno texto seu sobre a kupá, publicado em 1940 nos Proceedings of the Sixth Pacific Science Congress of the Pacific Science Association (Nimuendajú 1940). E esta publicação também é o último resultado indireto de suas relações com o Museu Etnológico de Berlim.
Conclusões
Este trabalho sobre uma coleção de objetos dos Ramkokamekrã em Berlim mostrou surpreendentes ramificações e filigranas históricas, teóricas e metodológicas. Enquanto exercícios intelectuais transdisciplinares, o estudo epistolográfico e a análise da documentação histórica complementar (listas de objetos, etc.), podem revelar diversas tendências que pautaram o passado da antropologia, neste caso a alemã e a brasileira. Ficou patente que a coleção de Berlim, como outras coleções etnográficas, é muito mais do que um mero conjunto de objetos organizados com base em critérios explícitos ou implícitos dos colecionadores ou dos contratantes. Ela fornece em si mesma, com seus objetos e a documentação complementar, informações diferenciadas sobre vários aspectos da prática antropológica e, por isso, deve ser reconhecida como uma fonte crucial – que, na realidade, fala tanto sobre os produtores e usuários indígenas dos objetos coletados quanto sobre os antropólogos envolvidos na sua coleta.
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[1] Este artigo é uma versão atualizada de uma pesquisa cujos resultados foram apresentados em duas ocasiões: na IVREA (Reunião Equatorial de Antropologia)/ XIIIABANNE (Reunião de Antropólogos do Norte e Nordeste), em agosto de 2013, na Universidade Federal do Ceará (UFC), em Fortaleza; e durante a German Anthropological Association (DGV) Conference, em outubro de 2017, na Freie Universität Berlin. As viagens para os dois eventos foram realizadas com auxílios da Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (PROPESQ) da UFPE.
[2] Agradecimentos, pelas diversas formas de ajudar na realização da pesquisa no museu, a Dr.ª Manuela Fischer, Dr. Richard Haas e Dr. Michael Kraus. Também sou muito grato a Anja Zenner, arquivista, e em particular a Lars Malareck pela enorme paciência de buscar todos os objetos da coleção Nimuendajú no depósito americanista do museu. Agradecimentos também ao Dr. Andreas Schlothauer, Berlim, pela dica valiosa com relação à coleção. Também agradeço a Elena Welper, pós-doutoranda no Museu Nacional/ UFRJ, pela ajuda na localização da correspondência entre Nimuendajú e Snethlage e pelas conversas sempre interessantes sobre nosso tema de pesquisa em comum. Agradecimentos também a Frederico Delgado Rosa e Christine Laurière pela leitura crítica da primeira versão deste artigo e pelas sugestões de modificações. Além disso, aproveito para expressar outra vez meus agradecimentos ao CNPq pela bolsa concedida na modalidade Pós-Doutorado no Exterior (PDE), processo nº 200455/2010-9, que possibilitou o levantamento dos materiais encontrados em museus etnológicos na Alemanha.
[3] Sobre Ehrenreich veja, por exemplo, Hempel (2015); sobre Koch-Grünberg, Kraus (2002, 2010); sobre Kissenberth, Hermannstädter (2002) e Kraus (2015); sobre Schmidt, Susnik (1991) e Bossert & Villar (2013, 2015); sobre Snethlage, Mere (2013) e Snethlage (2002); sobre a pesquisa etnológica alemã na Amazônia, de 1880 a 1924, veja o trabalho abrangente e detalhado de Kraus (2004).
[4] Uma oportunidade de visitar o Museu Etnológico de Berlim surgiu no âmbito de um pós-doutorado na Alemanha, de agosto de 2010 a fevereiro de 2011, financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), na modalidade PDE (Pós-Doutorado do Exterior).
[9] A NDW (Sociedade Emergencial das Ciências Alemãs) foi criada em 30 de outubro de 1920 como uma instituição central com o objetivo de facilitar a obtenção e distribuição de recursos para a pesquisa científica na Alemanha. Devido à situação financeira depois da Primeira Guerra Mundial, a NDW tinha um papel importante no contexto geral de precariedade e declínio que a pesquisa científica na Alemanha estava sofrendo naquele período. Em 1933, os nazistas se apoderaram da NDW, cujas atividades foram suspensas em 1945. A atual DFG (Deutsche Forschungsgemeinschaft/ Fundação Alemã de Pesquisa) foi criada em 1951 na antiga República Federal da Alemanha como sucessora da NDW.
[12] WK – CN, 03/10/1934 (Museu Nacional/UFRJ – CELIN – Arquivo Curt Nimuendajú, pasta 23; tradução P.S.). O pagamento ao qual Krickeberg se refere diz respeito a todas as despesas da expedição, ou seja, ele inclui tanto o próprio honorário de Nimuendajú quanto os gastos necessários para deslocamentos e para comprar mercadorias a serem usadas nas trocas com os indígenas.
[13] Nimuendajú também se refere à carta de 5 de novembro de 1934 em outra: CN – WK, 23/01/1935 (Ethnologisches Museum Berlin, E468/35)
[15] CN – WK, 25/06/1935; CN – WK, 30/07/1935; WK – CN, 20/08/1935; e CN – WK, 31/08/ 1935 (todas Ethnologisches Museum Berlin, E 468/35).
[16] CN – WK, 25/06/1935 (Ethnologisches Museum Berlin, E 468/35; tradução P.S.). A expressão “população neobrasileira”, considerada ultrapassada hoje em dia, é bastante comum na obra de Nimuendajú.
[22] CN – WK, 30/07/1935 (Ethnologisches Museum Berlin, E 468/35; tradução P.S.).
[23] Referência ao trabalho contratado pelo órgão indigenista, SPI (Serviço de Proteção aos Índios), para estabelecer os primeiros contatos pacíficos com os Parintintin (Kagwahiva) na região dos rios Machado e Maici. Nimuendajú descreve suas experiências de campo bastante aventureiras e arriscadas em várias cartas a Theodor Koch-Grünberg.
[24] CN – WK, 30/07/1935 (Ethnologisches Museum Berlin, E 468/35; tradução P.S.).